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100 anos: bate-papo na Biblioteca Pública celebra obra de Dalton Trevisan

O apelido de “Vampiro” cunhado ainda em vida – tanto por referência a uma de suas principais obras, “O Vampiro de Curitiba”, como pelo imaginário que criou com sua reclusão –, acabou tornando Dalton Trevisan realmente imortal como o personagem mitológico, mas através de suas obras. E foi para falar sobre a vida que sua obra tem ganhado menos de um ano após sua morte que a Biblioteca Pública do Paraná promoveu nesta sexta-feira (13) o bate-papo “Sexta-feira 13 com o Vampiro”, na véspera do aniversário de 100 anos do escritor.

O jornalista Irinêo Baptista Netto mediou a conversa com a atriz e dramaturga Nena Inoue, que está em cartaz até este domingo (15) no Teatro Guaíra com a peça “Daqui Ninguém Sai”, baseada nos escritos de Dalton, e com a agente literária Fabiana Faversani, assistente que acompanhou por anos o escritor e hoje é gestora da obra de Dalton Trevisan.

Obra extensa, aliás, que será relançada completa pela editora Todavia. O lançamento dos sete primeiros volumes da coleção – formada por 36 livros do autor e uma antologia organizada pelo escritor e tradutor Caetano Galindo e pelo diretor Felipe Hirsch – acontece neste sábado (14) na livraria Toda Letra, em Curitiba, bem no dia em que o Vampiro completaria 100 anos de idade.

“O Dalton tem grande relevância para a literatura brasileira e mundial. Recebeu o Prêmio Camões (principal prêmio literário da língua portuguesa) e foi traduzido para oito idiomas”, conta Fabiana. “Ele teve uma trajetória muito coerente, que o tornou um dos autores mais originais da língua portuguesa, que merece ser lido, relido e redescoberto, que é a ideia toda em torno do trabalho de reedição e lançamento do acervo”. 

Essa redescoberta será possível com o caminho que o trabalho de Dalton Trevisan trilha após sua morte, em dezembro do ano passado. O escritor curitibano passou grande parte da vida recluso e se recusava a dar entrevistas. Porém, não raramente era visto caminhando pela Capital paranaense, que é muito presente em seus contos, principalmente através de personagens que estavam à margem da sociedade, como bêbados, prostitutas, casais disfuncionais e o boêmio Nelsinho, personagem dos 15 contos de “O Vampiro de Curitiba”.

Um exemplo desse trajeto é a própria reedição da obra completa pela Todavia, que traz alguns sinais sobre a vida do autor em cada livro, inclusive com pequenas “dicas” biográficas sobre quem era Dalton Trevisan nas orelhas, o que o escritor se recusava a incluir nas publicações em vida. Com formato especial e novo projeto gráfico, os livros trazem, ao fim de cada volume, a seção “Canteiro de obras”, com material inédito com trechos de diários, cartas para amigos, bilhetes e desenhos.

Esse material está sob os cuidados do Instituto Moreira Salles (IMS), que recebeu, no ano passado, o acervo do curitibano. Também nesta sexta-feira, o IMS lançou o documentário “O arquivo de Dalton Trevisan”. O curta-metragem foi filmado na residência do escritor e traz a rara cena de Dalton em sua mesa de trabalho aos 99 anos.

HOMENAGENS – As celebrações do centenário do Vampiro também ganharam destaque na Biblioteca Pública do Paraná com uma programação especial. A fachada do edifício conta com um banner gigante celebrando o escritor, e a edição de junho do Jornal Cândido homenageia o autor. “Fazemos questão de homenagear o Dalton. Todo mundo sabe da imensidão da obra deste autor paranaense, que frequentou muito a Biblioteca Pública, que também fez parte da sua produção, de suas pesquisas e de suas leituras”, afirma o diretor-presidente da BPP, Luiz Felipe Leprevost.

“Isso é muito engraçado, porque por 99 anos o Dalton preferiu não ser visto, a não ser por sua obra, e agora tudo está aberto. Estamos vendo muita coisa da vida dele, as fotos, os arquivos”, ressalta Leprevost. “Desde jovem ele foi um criador e um polemista. A revista Joaquim, que ele editou, apresentou muito a literatura brasileira, sua própria literatura, e também o senso crítico do Dalton, que estava ali digladiando com a poesia simbolista que então era feita em Curitiba. E tudo isso criou um caldo cultural muito grande”.

Outra homenagem vem do Centro Cultural Teatro Guaíra, com a montagem, pelo Teatro de Comédia do Paraná (TCP), da peça “Daqui Ninguém Sai”. Sucesso de público no Festival de Curitiba, com filas dobrando a esquina, a peça encerra sua temporada neste domingo, no Guairinha. “Daqui Ninguém Sai” teve o título escolhido pelo próprio escritor antes de sua morte e reúne contos do autor, além de trechos inéditos de sua correspondência pessoal com figuras como Otto Lara Resende e Carlos Drummond de Andrade.

“Essa peça para ter outra dramaturgia, mas 20 dias antes desistimos e resolvemos refazê-la, celebrando não apenas o Dalton, mas o próprio teatro”, conta a diretora Nena Inoue, que além de trabalhar na adaptação, deu vida a outros personagens do escritor no teatro. “Apesar de ser um dos maiores contistas brasileiros e do mundo, ele é pouco lido. Então eu quis levar essa obra principalmente para o público jovem, eu queria um espetáculo popular, em que as pessoas tivessem acesso e entendessem sua obra”.

As sessões finais desta temporada acontecem nesta sexta-feira (13) e sábado (14), às 20h30, e domingo (15), às 18h, no Auditório Salvador de Ferrante (Guairinha), no Centro Cultural Teatro Guaíra. Os ingressos podem ser adquiridos na bilheteria do teatro e pelo site DiskIngressos.

Completando as homenagens, o jornalista curitibano Christian Schwartz escreveu a biografia do escritor, com previsão para ser lançada no segundo semestre deste ano. Outro presente no centenário do escritor é o anúncio de que o casarão onde viveu grande parte da vida, na esquina da Ubaldino do Amaral com a Amintas de Barros, será transformado em um centro cultural pela Fundação Cultural de Curitiba (FCC).

BATE-PAPO – Além de conhecer os bastidores da obra, o público que compareceu ao bate-papo na Biblioteca Pública do Paraná ganhou exemplares dos livros que estão sendo relançados e também algumas plaquetes, pequenas edições “piratas” organizadas pelo próprio autor.

Os fãs também puderam falar sobre sua relação com o escritor, como a jornalista Letícia Cardoso, que começou a ler os livros de Dalton Trevisan ainda adolescente, mas foi uma das poucas felizardas que conseguiram conhecê-lo em vida, quase que por acidente.

“Eu tive uma professora de literatura maravilhosa, que me apresentou a obra, e eu tinha os livros em casa, graças à minha mãe, que tinha a segunda edição de ‘A Noite da Paixão’, que li com 16 anos, em Paranavaí”, conta. “Me mudei para Curitiba e comecei a trabalhar em uma agência perto da casa do Dalton Trevisan, e passava por ela todos os dias. Coloquei em minha cabeça que ia conhecê-lo”.

Voltando de um almoço, Letícia passou pelo cachorrinho do escritor e começou a brincar com ele. Da porta, foi o escritor quem começou a conversar com ela. “Eu expliquei que tinha o livro, que lia quando era adolescente, e perguntei se poderia deixar ali para ele assinar. Deixei o livro junto com uma carta, e ele autografou. Conversei com ele mais umas três ou quatro vezes, sempre sobre coisas ordinárias. Nisso ele me deu alguns livros, com dedicatória, que eu guardo como um tesouro”, completa a jornalista.

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