Magno Malta – 12/06/2025 13h47

O STF decidiu criar “critérios” para o funcionamento das redes sociais. Ora, isso é legislar. E legislar sem voto!
Não quero ser alarmista, mas a cada novo capítulo da nossa vida institucional, me sinto mais próximo de cravar: a liberdade de expressão no Brasil está com os dias contados.
Na semana passada, escrevi sobre o risco iminente da derrubada do Artigo 19 do Marco Civil da Internet. Pois bem, o risco virou realidade. O Supremo Tribunal Federal formou maioria para declarar o dispositivo inconstitucional. E com isso, entramos numa nova e perigosa era.
Vamos direto ao ponto. O Artigo 19 do Marco Civil estabelecia que plataformas digitais só poderiam ser responsabilizadas por conteúdos de terceiros após ordem judicial. Em outras palavras, protegia a liberdade de expressão e impedia que redes sociais se transformassem em braços da censura estatal ou em editoras de conteúdo. Era um pilar do que restava de liberdade digital no país.
Mas o STF achou por bem rasgar esse princípio e junto com ele, a Constituição. Porque, convenhamos, não cabe à Suprema Corte legislar. Isso é função do Congresso Nacional. Só que, cada vez mais, o STF abandona seu papel de guardião da Constituição para assumir o de autor da nova ordem normativa brasileira. E o que vimos ontem foi exatamente isso, a Corte decidiu que o artigo era inconstitucional, mas, ao invés de se limitar a apontar essa inconstitucionalidade e devolver a matéria ao Legislativo, decidiu criar “critérios” para o funcionamento das plataformas. Ora, isso é legislar. E legislar sem voto!
Estamos testemunhando, e normalizando, a supremacia de um poder sobre os demais. Uma toga, por mais imponente que seja, não substitui o voto popular. É assustador como parte da sociedade ainda não compreendeu o que isso significa. O sistema democrático repousa no equilíbrio entre os Poderes. Quando um decide agir fora de sua caixinha, o resultado é previsível: autoritarismo.
E se você ainda duvida disso, preste atenção aos sinais. Na mesma sessão em que o STF sepultou o Artigo 19, o ministro Gilmar Mendes achou oportuno exaltar o regime chinês. Isso mesmo. Ele disse: “Somos todos admiradores do regime chinês, né, do Xi Jinping, que diz assim: ‘A cor do gato não importa, o importante é que ele cace o rato’.”
Detalhe: a frase nem é de Xi Jinping, mas de Deng Xiaoping. Mas deixemos o erro histórico de lado por um momento, o problema aqui não é factual, é moral.
Admiradores do regime chinês? Um regime que persegue opositores, controla o pensamento, censura a imprensa e monitora cada passo de seus cidadãos por meio de tecnologia de vigilância? Isso é o que queremos importar para o Brasil?
O problema não é só a frase infeliz. É o espírito que ela revela. A relativização dos princípios. O desprezo pelas garantias individuais. A construção narrativa de que “vale-tudo” em nome de um bem maior, mesmo que esse “bem maior” nunca tenha passado pelo crivo do povo. Quando um ministro do STF elogia abertamente um regime autoritário, ele não está apenas se distanciando do papel de magistrado, mas está flertando com a tirania.
E enquanto isso, o Senado assiste calado. A instituição que deveria fiscalizar o Judiciário, equilibrar os excessos, resguardar o Estado Democrático de Direito, simplesmente se omite. Já passou da hora do Senado cumprir seu dever constitucional e iniciar os processos de impeachment dos ministros que vêm extrapolando, reiteradamente, suas funções.
A liberdade de expressão está sendo dilacerada diante de nossos olhos. Hoje, é o Artigo 19. Amanhã, será outro direito. E quando a censura chegar à sua porta, talvez seja tarde demais.
A pergunta que fica é: até quando vamos assistir a isso em silêncio?
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Magno Malta é senador da República. Foi eleito por duas vezes o melhor senador do Brasil. |
* Este texto reflete a opinião do autor e não, necessariamente, a do Pleno.News.
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