O Banco do Brasil anunciou uma queda de 60% no lucro no terceiro trimestre de 2025. É um tombo raro para o maior financiador do agronegócio brasileiro e, mais do que um número, um sinal grave de que algo muito maior está acontecendo no campo.
O banco registrou um lucro líquido ajustado de R$ 3,8 bilhões, bem distante do desempenho de 2024. O motivo principal está claro nos relatórios: a inadimplência disparou, especialmente na carteira de produtores rurais. A taxa de atrasos acima de 90 dias chegou a 4,93%, com algumas linhas do agro ultrapassando 5,3%, níveis inéditos na última década.
Quando o banco que mais financia o agro precisa reforçar provisões bilionárias para cobrir possíveis calotes, o recado é direto: o setor está sob forte pressão.
A combinação que levou a esse cenário é conhecida pelos produtores:
- Juros altos sufocam o fluxo de caixa.
- O custo dos insumos continua elevado, mesmo com o dólar mais fraco.
- Clima extremo gerou perdas significativas em várias regiões.
- Super safra com preços baixos apertou as margens.
- Endividamento acumulado em estados como Rio Grande do Sul, Mato Grosso e Goiás chegou ao limite.
E tudo se agrava, porque o Brasil ainda não conseguiu estruturar um sistema de seguros rurais robusto, moderno e acessível. Sem seguro adequado, cada perda climática vira inadimplência; cada quebra de safra vira renegociação; e cada evento extremo volta como prejuízo para bancos, para o governo e para toda a cadeia produtiva.
O resultado aparece agora nas estatísticas: o maior banco agrícola do país está pagando a conta dessa tempestade perfeita.
Quando a inadimplência sobe, o banco reage como qualquer instituição financeira:
aumenta provisões, reduz o apetite por risco e encarece o crédito.
Se o produtor já estava com dificuldade para acessar financiamento, 2026 pode ser ainda mais duro se o processo de recuperação não acontecer no ritmo necessário.
O próprio BB admite que espera um “ponto de inflexão” na inadimplência apenas no início de 2026, e mesmo assim com cautela. Analistas consideram o cenário nebuloso.
Se a melhora não vier, o risco é duplo:
- Menos crédito para custeio e investimento.
- Mais concentração em grandes grupos e menos competitividade no campo.
Para um país que depende do agro para a balança comercial, para a geração de empregos e para a sustentação de sua economia, isso é um sinal preocupante.
A queda do lucro do Banco do Brasil não é um acidente isolado. Ela reflete:
- Falhas na política de crédito rural.
- Ausência de um seguro rural de amplo alcance que reduza riscos e estabilize a renda do produtor.
- Falta de proteção estrutural contra eventos climáticos.
- Juros que travam investimentos.
- E uma economia que não tem dado fôlego ao produtor.
Enquanto o discurso oficial muitas vezes pinta o campo como “privilegiado”, a realidade dos números mostra o oposto: o agro está carregando um peso que nem mesmo o maior banco público do país conseguiu suportar sem sangrar.
O tombo de 60% no lucro do Banco do Brasil é mais do que uma estatística, é um alerta.
Se o grande financiador do campo está sob pressão, imagine o pequeno produtor que tenta sobreviver numa economia travada, com crédito caro e clima imprevisível.
O agro sempre segurou o Brasil em tempos difíceis.
Agora, é o agro que está pedindo socorro, e o país não pode ignorar.


*Miguel Daoud é comentarista de Economia e Política do Canal Rural
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