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André Burguer: ‘A vingança de Gudin’

(*) André Burger

Eugênio Gudin morreu há quase quatro décadas. Viveu um século defendendo algo que, à sua época, parecia heresia econômica: o desenvolvimento do Brasil deveria vir do campo, não da fábrica. Para Gudin, as vantagens comparativas brasileiras estavam na agricultura, onde solo, clima e abundância natural podiam transformar o país num fornecedor global. Seus adversários não pensavam assim.

Durante boa parte do século 20, travou duras batalhas contra o projeto desenvolvimentista-industrialista que marcou a política econômica brasileira. De um lado, Gudin e alguns poucos liberais que enxergavam no mercado externo a oportunidade para o Brasil crescer aproveitando seus recursos naturais. Do outro, os industriais liderados por Roberto Simonsen, então presidente da poderosa Fiesp, que viam na indústria o único caminho aceitável para o progresso nacional.

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Os métodos industrialistas foram amplos e variados. Montagem artificial de indústrias via empresas estatais, subsídios generosos por meio do recém-criado BNDE (o “S” de social viria depois), protecionismo tarifário, reserva de mercado e convites generosos a multinacionais, como Juscelino fez com a indústria automobilística. Tudo isso regado a discursos de “soberania nacional” e “substituição de importações”.

Gudin enfrentou não apenas os industrialistas, mas os populistas de várias matizes (de Getúlio Vargas a João Goulart) e, depois, a tecnocracia desenvolvimentista dos militares pós-1964. Se estivesse vivo hoje, teria novos oponentes: aqueles que, em pleno século 21, acusam o agronegócio de ser “fascista”, “ambientalmente predatório” e “concentrador de renda”.

Gutin estava certo

Mas a história, como se vê, pode ser irônica.

O agro resistiu. O agro cresceu. O agro venceu.

Nos últimos 40 anos, o Brasil deixou de ser um importador de alimentos para se tornar um dos maiores fornecedores do planeta. O agronegócio brasileiro cresceu a uma taxa média de 4,07% ao ano nesse período — quase o dobro do crescimento médio do PIB nacional, que foi de 2,3% ao ano. A produção de grãos, por exemplo, saltou 334% nas últimas três décadas, enquanto a área plantada aumentou apenas 71%. Ou seja: mais produção, com menos terra — o que significa produtividade, algo que Gudin sempre pregou.

O agronegócio é a locomotiva do país

Em 2023, o setor agropecuário representou 24% do PIB brasileiro, segundo o Cepea/USP. Nas exportações, o agro respondeu por mais de 50% de tudo o que o país vendeu ao mundo. O PIB atual do agronegócio brasileiro — em torno de US$ 600 bilhões — supera o PIB total de países inteiros, como a vizinha Argentina.

Trata-se de um setor que não apenas gera superávit comercial robusto, mas também sustenta o real, alivia as contas públicas e reduz a vulnerabilidade externa do país. É o Brasil competitivo, não o Brasil dependente do BNDES.

Convém ser preciso: quando falamos em agro brasileiro, falamos de tecnologia, de ciência aplicada, de biotecnologia, de manejo racional do solo, de máquinas de última geração, de sementes geneticamente adaptadas, de integração lavoura-pecuária-floresta e de um setor que compete com o que há de melhor no mundo. Este é o agro que sustenta o Brasil.

A história inocentou Gudin

Muito longe da agricultura familiar romântica de baixa produtividade. E mais distante ainda dos assentamentos do MST, cuja produção é majoritariamente de subsistência ou fortemente subsidiada. O exemplo mais celebrado — e midiático — dessa agricultura foi o arroz orgânico, cuja produtividade é a metade do arroz convencional e cuja produção mal preenche uma fração irrelevante da demanda nacional.

Se o Brasil dependesse da agricultura familiar dos manuais de ONGs e dos assentamentos ideológicos, estaríamos todos na fila da FAO buscando ajuda humanitária.

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Mas, felizmente, havia Eugênio Gudin — e, sobretudo, o Brasil real.

Hoje, as previsões do velho liberal se materializam em cada navio que parte lotado de soja, milho, carnes, açúcar, algodão, café, etanol e celulose. Em cada safra recorde, em cada avanço tecnológico, em cada ganho de produtividade por hectare. O campo, tantas vezes desprezado pelos ecologistas e planejadores do asfalto, ergueu o país e alimenta o mundo.

Gudin venceu. Afinal, a história lhe fez justiça.


André Burger é economista e conselheiro superior do Instituto Liberal

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