Marisa Lobo – 16/05/2025 10h42

Como psicóloga, preciso levantar uma preocupação séria e crescente: o envolvimento emocional excessivo de algumas pessoas com bebês reborn — bonecos hiper-realistas tratados como filhos reais. O que inicialmente poderia ser compreendido como um recurso simbólico ou terapêutico, tem ultrapassado os limites da realidade em muitos casos, dando sinais claros de sofrimento psíquico não elaborado.
Tenho acompanhado relatos de pessoas que:
– alimentam rotinas diárias com o boneco como se fosse um bebê vivo;
– apresentam crises emocionais intensas se separadas dele;
– exigem que familiares, amigos e até o Estado reconheçam o boneco como “filho”;
– afastam-se de vínculos humanos para viver em função do objeto;
– resistem a qualquer tentativa de ajuda, afirmando que “não há problema nenhum”.
Essas atitudes não podem ser vistas com normalidade ou romantizadas. Estamos diante de possíveis sinais clínicos que exigem atenção e intervenção.
Transtornos possíveis envolvidos
O comportamento excessivamente afetivo e simbiótico com o bebê reborn pode estar relacionado a:
* Transtorno do luto complicado: quando a dor pela perda de um filho, gestação ou sonho materno não é elaborada e permanece viva, transformando o boneco em substituto emocional.
* Transtornos de apego: dificuldade em estabelecer vínculos reais e seguros, resultando em afeto direcionado a objetos por medo de rejeição.
* Transtornos de personalidade: em especial traços de dependência, histrionismo e borderline, quando há dificuldade em distinguir fantasia e realidade afetiva.
* Transtornos dissociativos e psicóticos: nos casos mais graves, quando há negação total da realidade, delírios e comportamento paranoico em torno do boneco.
* Depressão e solidão patológica: o bebê reborn passa a ser a única “companhia segura”, o que indica uma desconexão grave com o mundo exterior.
O exagero não é inofensivo
É importante que sociedade, famílias e profissionais da saúde não minimizem esses sinais. O exagero afetivo em torno de um objeto não pode ser tratado como “só uma escolha”. Quando há sofrimento, isolamento, rigidez emocional e substituição da vida real por uma fantasia, estamos falando de um quadro clínico que precisa de ajuda profissional.
Negligenciar isso é perpetuar o sofrimento silencioso de pessoas que estão clamando por acolhimento, mas se refugiaram em uma construção simbólica por medo da dor real.
Como psicóloga, deixo aqui este alerta:
– Não trate como “normal” o que é um pedido de socorro disfarçado;
– Não incentive o reforço de vínculos com o irreal como se fosse cura;
– Respeite a dor, mas também proponha verdade e ajuda;
– O acolhimento é essencial, mas a conivência com a fantasia pode agravar o sofrimento;
– Buscar ajuda psicológica não é sinal de fraqueza, mas de coragem e amor próprio.
Conclusão
A saúde mental precisa ser levada a sério. Há uma linha tênue entre afeto simbólico e ilusão emocional. Quando essa linha é ultrapassada, não estamos mais falando de liberdade emocional, mas de aprisionamento psíquico.
Se você conhece alguém que vive em função de um bebê reborn — ou se isso acontece com você —, não ignore os sinais. Há tratamento, há escuta, há caminhos de cura. E há vida além da fantasia.
Vamos falar sobre isso com responsabilidade, acolhimento e verdade.
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Marisa Lobo atua como psicóloga e psicanalista, é pós-graduada em Psicanálise; Gestão e Mediação de Conflitos; Educação de Gênero e Sexualidade; Filosofia de Direitos Humanos e Saúde Mental; tem também habilitação para magistério superior. |
* Este texto reflete a opinião do autor e não, necessariamente, a do Pleno.News.
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