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Big techs estão por trás das tarifas impostas ao Brasil, diz ex-embaixador

O ex-embaixador Rubens Barbosa, um dos mais experientes diplomatas brasileiros, avalia que as sanções impostas pelos Estados Unidos ao Brasil, com a elevação das tarifas de importação para 50%, não decorrem diretamente das ações do ministro Alexandre de Moraes nem da atuação do governo Lula na política externa. Para Barbosa, o cerne da questão está na reação das big techs às medidas de “regulação” em curso no Brasil, que atingem diretamente os interesses comerciais dessas empresas. “Estão implicando com o que a gente está fazendo no país”, afirma.

Na visão do diplomata, que já chefiou as embaixadas do Brasil em Londres e Washington, a recente ofensiva norte-americana contra produtos brasileiros — agora ampliada por uma nova investigação — reflete pressões econômicas motivadas por interesses empresariais, e não por um embate ideológico. Elon Musk, Mark Zuckerberg, Sundar Pichai, Tim Cook e Sam Altman, líderes das maiores empresas de tecnologia dos Estados Unidos, estariam por trás das movimentações que culminaram na retaliação comercial.

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Para o ex-embaixador, cabe ao governo brasileiro abandonar a retórica ideológica e agir pragmaticamente, como estão fazendo a Europa e o Japão, que já negociam reduções de tarifas. “O Brasil precisa negociar tranquilamente, pedir a volta da tarifa a 10%”, recomenda o diplomata, ao criticar o enfraquecimento do Itamaraty na condução das relações internacionais.

Embora reconheça que a crise atual é grave, o ex-embaixador minimiza seus efeitos a longo prazo. Segundo Barbosa, trata-se de um episódio pontual, alimentado pelas divergências entre o governo Lula e a administração Trump. “Isso vai passar”, resume.

A seguir, os principais trechos da entrevista.

Por que os EUA impuseram tarifas de 50% sobre produtos brasileiros?

Há um conjunto de fatores que confluíram para a imposição das tarifas. As ações do deputado licenciado Eduardo Bolsonaro contribuíram, mas não são a causa principal. O que está por trás disso são os processos contra as grandes empresas de redes sociais, que estão em atrito com a Justiça do Brasil. Isso envolve a derrubada do X e a regulamentação das big techs. O Supremo brigou com Elon Musk. Nesta terça-feira, os EUA anunciaram uma nova investigação contra o Brasil, com base na Seção 301 da Lei de Comércio Norte-Americana — também por influência das big techs. A questão vai além da parte comercial, incluindo até a área ambiental e o desmatamento da Amazônia.

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Como o Brasil poderia reduzir as tarifas impostas pelos EUA?

O Brasil tem de agir como todos os demais países: deixar de negociar ideologicamente, negociar com tranquilidade e pedir a volta da tarifa a 10%. A tarifa de 10% já está precificada. Isso vai valer para todo mundo enquanto o presidente Donald Trump estiver na Presidência dos Estados Unidos. A Europa e o Japão estão negociando a redução de 25% ou 30% para 10%. Além disso, o Brasil precisa dar uma resposta às big techs. A carta trata desse tema. Para isso, é necessária uma ação política do governo. O presidente Lula, o ministro Mauro Vieira (Relações Exteriores) e o vice-presidente Geraldo Alckmin: alguém tem de ir aos Estados Unidos, como todos os demais estão fazendo. O Brasil, por questões ideológicas, não está querendo participar.

De que maneira o senhor avalia o papel do Itamaraty nesta crise?

O Itamaraty perdeu espaço. Agora, é necessária uma decisão política do governo para se expor. Mandar outra carta aos Estados Unidos, na minha visão, não vai adiantar nada. O governo está em contato com o governo norte-americano desde maio e não recebeu nenhuma resposta até agora. Isso está sendo tratado em um nível muito baixo. O Brasil precisa elevar o nível dessa discussão, se realmente quiser obter algum avanço. Há um componente ideológico muito forte que impede uma atuação técnica do Itamaraty.

Está escrito na carta: se o Brasil retaliar, os EUA retaliam de novo. Os norte-americanos impuseram 50% de tarifas. Está dito na carta: se vocês colocarem 10%, 20%, 30%, 50% contra nós, colocaremos esse número em cima dos 50%. Não existe espaço para isso. Os empresários pediram muito que não houvesse retaliação. O presidente Lula falou em retaliação e tal, mas acho impossível pensar em retaliar os Estados Unidos. A gente não tem cacife político-econômico para agir dessa forma. Nem o Brasil, nem a Europa, nem o Japão. Ninguém tem cacife político para retaliar fortemente os EUA. A União Europeia anunciou que retaliaria, mas vai esperar até 1º de agosto e ainda tem esperança de negociar uma redução das tarifas.

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Qual é o risco de essa crise comercial evoluir para um enfraquecimento das relações diplomáticas entre os EUA e o Brasil?

Isso vai passar. Já tivemos outras crises tão ou mais graves do que esta. E passaram. Sai Trump e a crise acaba. Se Trump não for reeleito daqui a dois anos, a crise acaba. É uma crise circunstancial, provocada pela distância ideológica entre o governo Lula e o governo Trump. Esse é o fato. Quando saírem os personagens, a crise termina. Do ponto de vista histórico, olhando para frente, não passará de mais um episódio nas relações entre Brasil e Estados Unidos.

Os EUA reagiram à regulamentação das big techs por questões pragmáticas (as empresas são norte-americanas) ou por questões morais, em defesa das liberdades?

Você assistiu à posse do presidente Trump? Todos os líderes das big techs estavam lá: Elon Musk, CEO da [Tesla] e da [SpaceX]; Jeff Bezos, ex-CEO da [Amazon]; Mark Zuckerberg, CEO da [Meta]; Sundar Pichai, CEO da [Alphabet/Google]; Tim Cook, CEO da [Apple]; e Sam Altman, CEO da [OpenAI]. Todos reunidos, juntos, ali na frente, com os ministros. A sanção é uma questão de interesse puro, comercial, econômico. No Brasil, estamos discutindo assuntos que não têm nada a ver. O que estamos conversando agora não saiu em lugar algum. A gente fica pensando que a carta de sanção é por causa de Bolsonaro, por causa de não sei o quê. Na verdade, essa questão toda está ligada a um grupo de empresas poderosíssimas, que tem uma visão crítica sobre a regulamentação das big techs.

A questão comercial pode ser descartada?

Não tem a ver com a parte comercial, porque o Brasil é superavitário. Trump está mirando países que são superavitários em relação aos norte-americanos. No caso do Brasil, os EUA têm superávit. Por que suscitaram essa tarifa comercial? Por alguma razão muito forte. E a razão muito forte, que no Brasil ainda não foi entendida, é a visão das big techs contra o que está acontecendo com as plataformas aqui no país.

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