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Cabo Verde na Copa do Mundo: à ESPN, presidente, primeiro-ministro e técnico detalham sonho de ‘país improvável’

O técnico Bubista, apelido de Pedro Brito, sempre soube que levaria Cabo Verde à Copa do Mundo pela primeira vez, independentemente de quais fossem os jogadores da geração. O Primeiro-Ministro do país, Ulisses Correia e Silva, por outro lado, admitiu que a classificação – conquistada na última Data Fifa com a vitória por 3 a 0 sobre Essuatíni – era um sonho que parecia distante demais. O presidente, José Maria Neves, foi além do futebol e disse que o próprio país não tinha expectativa de sucesso quando proclamou sua independência, há 51 anos. A ESPN conversou com os três para entender melhor os bastidores da melhor história das eliminatórias para a Copa do Mundo de 2026, em Canadá, Estados Unidos e México.

Cabo Verde é a segunda menor nação a disputar um Mundial. São cerca de 525 mil habitantes. Se fosse uma cidade no Brasil, seria apenas a 41ª em um ranking de população, pouco menor que Florianópolis. Na lista de países com seleções em Copa, está atrás apenas dos 353 mil da Islândia em 2018.

Bubista está no comando da equipe cabo-verdiana desde 2020 e foi responsável por captar e convencer grande parte dos talentos que fazem parte da lista de selecionados que entrou para a história. “Foram jogadores que eu trouxe. Para convencer alguns jogadores a virem, [o discurso] foi nesse sentido, ‘vamos lutar pela Copa do Mundo, temos condições para isso’. Com a convicção de que tínhamos condições para chegar nesse ponto, e os jogadores embarcaram nessa nossa conversa”, ele contou em entrevista exclusiva à ESPN.

A vaga no Mundial de 2026 veio após uma campanha “consistente” nas eliminatórias, palavra preferida do técnico para descrever a trajetória. Foram 23 pontos em dez jogos, um aproveitamento de 76,7%. A única derrota foi na 3ª rodada, contra Camarões, fora de casa, considerada essencial por Bubista. “A partir dela, a equipe se recompôs e, principalmente, sentiu que era possível [conseguir a vaga], porque tivemos muitas oportunidades de marcar. Aprendemos com aquela derrota e percebemos que tínhamos que ser mais rigorosos em todos os aspectos, nós conseguimos isso.”

A partir de Camarões 4×1 Cabo Verde, foram cinco vitórias e um empate, culminando no jogo com cara de final contra Essuatíni. Bubista relatou um pouco da preparação para o confronto: “Desde o início da semana [de Data Fifa], a mensagem foi que íamos fazer o que costumamos fazer em casa. Em casa, não sofremos nenhum gol durante toda a competição. A mensagem foi de ter confiança naquilo que fazemos no processo e ter coragem para enfrentar os momentos menos bons do jogo”.

Ao longo dos dias que antecederam a decisão, a comissão pregou tranquilidade. Uma estratégia utilizada foi liberar o acesso dos jogadores a famílias e amigos até a véspera da partida. A ideia era deixar o clima mais leve possível.

Os Tubarões Azuis tinham chance de não irem para a Copa na última rodada, se tropeçassem contra Essuatíni e Camarões vencesse o duelo com Angola. Porém, de acordo com Bubista, “era quase impensável que não conseguíssemos essa classificação”. Então, a seleção não acompanhou o jogo dos rivais e só foi descobrir o resultado dos camaroneses (um empate por 0 a 0) horas depois dos términos das partidas simultâneas.

A conquista da vaga foi muito mais que esportiva. Foi sobre identidade. O presidente de Cabo Verde, José Maria Neves, falou à reportagem sobre a importância da classificação para o arquipélago: “Cabo Verde era um país improvável e hoje, com esta vitória, nós abrimos caminho a todas as possibilidades”.

Durante as celebrações, José Maria Neves chegou a dizer que a vaga na Copa do Mundo de 2026 era como uma segunda independência – a primeira, oficial, foi em 1974. “Quando nós conquistamos a independência, ninguém acreditava em nós. Não temos recursos naturais tradicionais, só temos as cabo-verdianas e os cabo-verdianos. Muito sol, muito vento e muito mar. Por isso é que somos tubarões azuis. Então, ao ganhar, mostramos que a independência valeu a pena e que temos todas as condições para, nos próximos 50 anos, fazermos muito mais e melhor por Cabo Verde e mostrar que, sim, Cabo Verde é um país possível e temos que continuar a trabalhar arduamente para construir a prosperidade“.

O primeiro-ministro, Ulisses Correia e Silva, também celebrou a vaga em resposta à ESPN: “Concretizamos uma ambição e um desejo, um sonho de Cabo Verde há muitos anos”.

O chefe do governo afirmou que a conquista é essencial para aumentar o grau de autoestima em relação ao país. “Aquilo que poderia parecer impossível com um país como Cabo Verde, tornou-se possível. Então, em todas as outras áreas pode se tornar possível, o próprio reflexo na vida pessoal é [a mensagem] de que ultrapassem os limites, que não fiquem presos às dificuldades que existem na vida. Essa é a mensagem que nós temos tentando passar, para que o próprio cabo-verdiano confie mais em si próprio e nas suas possibilidades e capacidades.”

País em festa com a vaga

A população está em êxtase com a conquista. “Acho que todo cabo-verdiano estava na rua comemorando [na segunda-feira]”, brincou o presidente José Maria Neves, que tem papel de chefe de Estado. O governo havia decretado ponto facultativo, tanto no jogo contra Líbia, dia 8, quanto contra Essuatíni, que confirmou a vaga. O primeiro-ministro confirmou que a medida deve ser novamente adotada nos jogos do Mundial.

A classificação de Cabo Verde ao principal torneio de seleções do mundo passa pelos esforços federais para apoiar a equipe nacional, principalmente no âmbito financeiro. O governo chegou a pagar os custos de viagens dos Tubarões Azuis durante as eliminatórias africanas, garantindo deslocamento de qualidade para Angola, por exemplo, que fica a mais de 10 horas de voo de distância.

“Mas há um outro trabalho, mais de fundo, que tem sido feito por meio da prospecção, que dá a possibilidade de conseguir identificar talentos em qualquer parte do mundo”, adicionou Ulisses Correia e Silva. “Depois há todo um trabalho que vem desde a iniciação esportiva nas escolas, nos clubes, criar as condições para irmos desenvolver este viveiro de talentos e casarmos as duas coisas: aquilo que nós produzimos internamente em termos de talentos residentes no território nacional, aquilo que nós temos disponível a nível da nossa diáspora”.

Apesar da pequena população local, de cerca de 500 mil habitantes, há cerca de 1,5 milhão de cabo-verdianos morando fora do país, segundo estimativa do Instituto Nacional de Estatística. A maioria está em território estadunidense, mas também são muito presentes em Portugal, França, Holanda e outros mais de 40 países. “Nós estaremos em casa nos Estados Unidos”, avaliou o presidente José Maria Neves.

Maioria do elenco histórico que levou à Copa não é de Cabo Verde

Essa característica cabo-verdiana de diáspora foi fundamental para a conquista da vaga. O primeiro-ministro relatou que “nós já temos experiência de alguns jogadores que estão na seleção de futebol de Cabo Verde e que, antes de ingressarem na seleção, nem sequer conheciam Cabo Verde”. Dos 23 relacionados para o último jogo, treze nasceram fora do arquipélago.

A expectativa do governo é usar o trabalho de prospecção de talentos vista no futebol também em outras áreas do país. “Se nós conseguirmos recrutar, a nível global, talentos para o esporte, podemos recrutá-los também para a ciência, para a medicina, para a tecnologia, para a academia, para atividade relacionada com os negócios. Tendo em conta que é um país pequeno, tem sempre alguns déficits em termos de quantidade de recursos humanos altamente qualificados. E isto permite nos fazer esta projeção de um país além de fronteiras”, explicou Ulisses Correia e Silva.

Quanto à Copa do Mundo de Canadá, Estados Unidos e México, tanto o presidente quanto o primeiro-ministro falaram em representar Cabo Verde com dignidade. “Quando entramos em campo são onze contra onze e noventa minutos de jogo. Teremos que estar em condições de competir contra qualquer um. É claro, nas condições de competitividade que nós temos”, projetou o chefe do governo.

O técnico Bubista não quis falar muito, afirmando que está muito longe e que, por enquanto, estão na fase de descanso. Porém, ele prometeu que “teremos uma equipe com espírito ganhador e com espírito de fazer de tudo para que o nosso país seja dignificado na competição”.

“Independentemente em grupo que estivermos, temos certeza que levaremos o jogo com um nível bastante positivo, porque o nosso grupo de jogadores também tem muita ambição. Todos estão bastante ansiosos também em relação a isso”, finalizou.

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