São poucos atletas que conseguem realizar seus maiores sonhos no esporte. E fazer isto com menos de três anos de prática, então, parece impossível. Querer se aposentar pouco depois parece ilógico. Mas é exatamente esta a trajetória de Eduarda Bezerra, a Duda, campeã no último dia 11 da categoria Wellness do Mr. Olympia 2025, uma espécie de Copa do Mundo do fisiculturismo.
Pernambucana de Caruaru, com 27 anos e de uma simpatia impressionante nas duas horas em que passou nas instalações da ESPN, em São Paulo, no último dia 20, a brasileira chamou a atenção por um feito quase incompreensível: ser eleita a ‘rainha do Olympia’ apenas em sua segunda participação no torneio.
Inspirada pelos grandes nomes da categoria Welness, como as também brasileiras Francielle Mattos e Isabelle Pereira, Duda conheceu o fisiculturismo só em 2022, quando, por incentivo do marido, viu suas compatriotas brilhando no palco do Mr. Olympia pela televisão.
Imediatamente, a pernambucana se identificou com a categoria Wellness, que cobra feminilidade das competidoras, dando destaque principalmente aos membros inferiores e à tonificação do corpo, algo que já estava alinhado com o físico que ela mantinha como modelo fitness. Logo depois, em janeiro de 2023, Duda começou no fisiculturismo e estreou já em abril.
Apontada como grande sucessora de Francielle, tricampeã da categoria no Olympia, foi em 2025, com apenas dois anos no esporte, que Duda subiu nos palcos e superou Isa Pereira, que detinha o título da Wellness até então.
Das passarelas aos palcos
Nesta entrevista exclusiva à ESPN Brasil, Duda relembrou sua ascensão meteórica: “Eu treino há 14 anos mais ou menos e estou no fisiculturismo vai fazer apenas três. E assim, são três anos muito diferentes na minha vida. Muda muito.”
“É a dedicação, a forma de treinar, o detalhe que você trabalha da musculatura, a estratégia da musculatura que você precisa lapidar. A gente trabalha em prol de detalhes que antes eu não fazia. Hoje em dia, eu tenho que manter um físico feminino lapidado, sem exageros e com todo um cuidado”, detalhou.
O desafio do planejamento de treinos para manter o físico é tão complicado que Duda até deixou de fazer alguns exercícios considerados populares. Isto porque, próximo à competição, ela deve manter o físico, e não evoluí-lo.
“Falar para você que eu não agacho livre mais, mas quando eu fazia, eu pegava ali 220, 230 [quilos]”, exemplificou a campeã.
Mas o fisiculturismo não envolve só levantar cada vez mais peso na academia. Um dos componentes mais importantes é, na verdade, saber mostrar o resultado disso nos palcos. Então, muito além dos personal trainers na academia, Duda teve que investir seu tempo em outro tipo de profissional: uma professora de poses.
De uma a duas horas por semana com a profissional, Duda passou a treinar poses todos os dias antes de dormir e logo depois de acordar. Sua rotina nos palcos se tornaria automática, e uma coisa a diferenciaria: a atenção aos detalhes.
“Eu trabalhava muito em todo um contexto geral, da musculação até o cabelo, a pose, a passarela. Na nossa categoria, nós não temos a música, é qualquer uma que o DJ coloca e a gente vai. Então, você precisa decorar e saber o que vai fazer, independentemente da música”, explicou.
E é justamente aperfeiçoando as poses, e a sequência delas, que Duda consegue passar um dos pontos mais subjetivos sendo julgados nos palcos da Wellness: a feminilidade. Mesmo levantando pesos assustadores na academia, a brasileira ainda encontrou a resposta para passar sutileza misturada com força.
“Então, eu acho que é muito importante para a atleta trabalhar a pose, porque conta muito saber posar com leveza. A gente tem a musculatura muito agressiva, querendo ou não, tem muito músculo. E aí, se você não sabe levar aquela leveza, a feminilidade dentro daquela musculatura, não fica legal em uma passarela.”
Tantas variáveis necessárias para entregar um bom resultado custam muito – principalmente tempo. A academia para de ser um passa-tempo diário para se cuidar e se torna uma profissão. E mesmo com o passado de musa fitness e a paixão pelo esporte, Duda ainda sentiu dificuldade em se adaptar à nova rotina.
“No início foi bem difícil. Eu não podia mais estar em aniversários. Eu não podia estar socializando porque tinha horário para dormir e horário para acordar. A rotina muda. Nada de festas, nada de balada, você vive 100% para o esporte”, disse Duda.
Mas foi se entregando “com os dois pés e com o meu corpo completo” que ela conseguiu, enfim, chegar ao circuito profissional e subir pela primeira vez no palco do Mr. Olympia de forma tão rápida.
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Tinta, último pump e o título do Mr. Olympia 2025
Com o físico já inteiramente adaptado para a realidade do fisiculturismo, a ex-modelo tomou os palcos do Olympia. Já tendo garantido um terceiro lugar em sua estreia, em 2024, Duda chegou em 2025 para fazer história.
Vindo de uma vitória unânime no Arnold Ohio, outra importante competição da modalidade, Duda partiu confiante para o Mr. Olympia 2025. Já tendo batido Isa Pereira no ano, a pernambucana despontava como favorita. O que não significa que a preparação para o maior palco do mundo ficou mais fácil.
Tendo a preparação física feita, o primeiro estágio dos “últimos passos” para subir no palco é um dos mais conhecidos: a tinta. Um corpo mais escuro ajuda no destaque dos músculos sob as luzes do palco, e, por isso, atletas de pele clara precisam pintar o corpo antes de competir.
Para garantir, inclusive, que a tinta não “derreta” no palco, a preparação para ela ocorre dias antes da pintura em si, como relembrou Eduarda.
“A gente começa a fazer a esfoliação da pele três, quatro dias antes da pintura para tirar todo o hidratante. O cabelo já não pode ser lavado escorrendo o shampoo para que ele não fique na pele e desbote a tinta. Tem que ter todo um cuidado, porque quando se está no palco [isto] conta muito. O que vai mostrar sua musculatura é uma pintura perfeita.”
“A gente faz a pintura nos Estados Unidos em duas mãos de tinta. A primeira acontece um dia antes do campeonato, e a outra é no dia. É uma tinta que seca super-rápido”, detalhou.
A tinta, apesar de ser fundamental no físico para a competição, permitindo uma mostra melhor dos músculos, cria um grande problema em outra parte: a maquiagem.
Considerando a importância da estética na categoria Wellness, uma diferença muito grande entre o corpo e o rosto pode causar problemas para a participante. Por isso, todo o serviço estético foi contratado por Duda e sua equipe.
“A maquiagem não precisa estar no tom da tinta, porque ela é muito escura. Mas tem que ficar próxima, para o rosto não ficar muito branco, muito separado no contraste de cor. E a gente contrata maquiadoras profissionais que trabalham com a nossa categoria para que fique tudo impecável”, relatou a pernambucana.
Resolvida toda a preparação visual, resta uma coisa a ser feita para atingir a perfeição no palco, o que os atletas do meio chamam de “pump”.
O pump nada mais é que o “inchaço” natural que um músculo tem pouco após ser acionado em comparação a quando ele está em completo repouso. Isto, novamente, facilita a mostra das curvaturas do corpo durante todas as poses chaves da sequência.
Para alcançar este pump, Duda tem uma rotina muito bem definida já nos bastidores do palco principal, pouco antes de sua apresentação ‘para valer’.
“Uma horinha antes de subir [no palco], a gente come uma pizza, come um sal puro mesmo e vai aquecendo, fazendo alguns exercícios sem cargas, só com elásticos e mini bands. É como se fosse um treino sem tanta força, sem tanto peso, para não desgastar o físico.”
Com tudo isso feito, Duda estava pronta para subir no palco do Mr. Olympia 2025. E lá, competindo com a dominicana Elisa Alcantara e a então atual campeã e compatriota Isa Pereira, a pernambucana viu seu nome anunciado mais uma vez, assim como havia sido no Arnold Ohio.
“Falar pra você que é algo surreal”, disse Duda sobre o momento em que ouviu seu nome. “Porque mesmo que a gente trabalhe, que a gente tenha convicção, parece que é inacreditável, em tão pouco tempo eu me tornei uma Miss Olympia. Eu indo pela segunda vez e já ter esse título desbancando a atual campeã”, continuou.
Duda, inclusive, reforçou que sua ascensão meteórica também é, em parte, surpreendente para ela mesma. Apesar da sua profunda dedicação, que ela faz questão de reforçar, um título tão cedo na carreira do fisiculturismo ainda assim é inesperado.
“Eu não imaginava, confesso pra você. Eu sabia que eu tinha capacidade de estar no Olympia. Só que eu não sabia que eu poderia vencer três shows. Eu não cogitei em nenhum momento estar dentro do top três. Para mim, era algo muito distante. Eu sempre falo que as coisas vêm mais rápido até mim do que eu vou buscar elas.”
“É literalmente uma realização pessoal e profissional. É muito, muito, muito grandioso. É um feito histórico, ninguém nunca fez isso dentro do fisiculturismo. Vencer os dois maiores campeonatos do mundo no mesmo ano. É tudo muito incrível o que eu estou vivendo, sendo agora a Miss Olympia, a rainha da categoria”, celebrou.
“Eu me sinto literalmente a dona da categoria.”
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Aposentadoria à vista
E o que fazer depois de conquistar seu grande sonho de vida e de carreira e se tornar “a dona da categoria”? Para Eduarda Bezerra, a resposta para essa pergunta é pensar na aposentadoria.
A pernambucana, é claro, está aproveitando a vida como campeã. Passou alguns dias em sua cidade natal, Caruaru, vem dando entrevistas e esperando a ficha cair por completo.
“Está todo mundo muito em êxtase. Toda a minha família, os meus amigos. Eu não consegui ver muita gente porque eu tive que retornar para São Paulo para cumprir as agendas aqui. Mas está todo mundo vivendo um sonho”, afirmou.
“O meu sonho é o sonho das pessoas que me amam e estão sempre torcendo por mim”, seguiu.
E valorizar as pessoas que a amam é algo que Eduarda faz de forma muito consciente. Ela nutre uma relação muito próxima com suas seguidoras, mesmo antes da premiação. Agora, como grande campeã, não se esconde da responsabilidade de inspirar outras mulheres a cuidarem do corpo e a chegarem mais longe no esporte.
“Eu acho que antes de conquistar essa medalha, eu já conseguia motivar muitas mulheres. Mas fazer uma troca diária com as pessoas, ajudando, conversando, motivando, é muito importante, se torna um outro grande título”, comentou Duda.
“Às vezes, eu estou cansada e não quero ir para a academia, mas se eu não for, tantas não vão porque não estão me vendo lá. Elas falam que eu sou o pré-treino delas. Então, esse prêmio aqui não é só meu, mas delas também.”
Mas mesmo curtindo o carinho e a aclamação de família, amigos e seguidores, Duda não deixa de planejar a aposentadoria, e ela está mais próxima do que se possa imaginar.
Mesmo com apenas duas participações no Mr. Olympia, Duda surpreendeu ao cravar com muita tranquilidade quanto tempo ainda tem de carreira: três anos e três títulos na categoria Wellness na maior competição do mundo.
“Eu tenho 27 anos e já vai fazer três anos que eu estou dentro do fisiculturismo. Eu pretendo fechar com quatro vitórias unânimes como Miss Olympia e depois encerrar a carreira e aproveitar os momentos. Porque eu acho que o legado que eu vou deixar vencendo quatro vezes é suficiente para mim. Hoje, eu me sinto muito satisfeita”, disparou.
Duda, entretanto, reconhece que é difícil abrir mão da carreira, apontando que “daqui a pouco, vou em 10 (anos)”.
Mas o que fazer depois de quatro títulos consecutivos de Miss Olympia? Isso já é um pouco mais difícil de precisar em meio aos compromissos de mídia – e pessoais – durante as semanas pós-título. Mesmo assim, Duda já tem alguns objetivos.
“Ainda não tive tempo de pensar, você acredita? Mas eu quero muito ser empresária em algum ramo do esporte. Tenho alguns planos e espero que eu consiga para o ano que vem já no meio do ano.”
Mas, enquanto ainda podemos contar com Duda nos palcos do mundo do fisiculturismo, seja no Olympia, no Arnold ou mesmo aqui no Brasil, ela deixa uma mensagem para quem a acompanha e se inspira nela.
“Eu quero falar para vocês que nunca desistam dos seus sonhos e que mesmo cansadas, sendo mães, guerreiras, batalhadoras e trabalhadoras, vocês precisam cuidar de si, ter amor próprio e ter um momento para vocês se cuidarem. Porque se a gente não se cuidar, quem é que vai?”, questionou a campeã.
“Então, contem comigo. Eu estou sempre aqui nas redes sociais para ouvir, para apoiar e para incentivar vocês. Esse prêmio aqui é nosso. Obrigada pelo carinho e pela torcida”, finalizou.


