O desmatamento da Amazônia brasileira é responsável por cerca de 74,5% da redução de chuvas e por 16,5% do aumento da temperatura do bioma nos meses de seca. Pela primeira vez, pesquisadores conseguiram quantificar os impactos da perda de vegetação e das mudanças climáticas globais sobre a floresta.
Liderado por cientistas da Universidade de São Paulo (USP), o estudo traz resultados fundamentais para orientar estratégias eficazes de mitigação e adaptação, temas-alvo da Conferência do Clima das Nações Unidas (COP30), marcada para novembro em Belém, Pará.
Os cientistas analisaram dados ambientais, de mudanças atmosféricas e de cobertura da terra de aproximadamente 2,6 milhões de quilômetros quadrados (km2) na Amazônia Legal brasileira em um período de 35 anos (1985 a 2020).
Os pesquisadores analisaram os efeitos da perda florestal e das alterações na temperatura, na precipitação e nas taxas de mistura de gases de efeito estufa.
As chuvas apresentaram uma redução de cerca de 21 mm na estação seca por ano, com o desmatamento contribuindo para uma diminuição de 15,8 mm. Já a temperatura máxima aumentou cerca de 2 °C, sendo 16,5% atribuídos ao efeito da perda florestal e o restante às mudanças climáticas globais.
“Vários artigos científicos sobre a Amazônia já vêm mostrando que a temperatura está mais alta, que a chuva tem diminuído e a estação seca aumentou, mas ainda não havia a separação do efeito das mudanças climáticas, causadas principalmente pela poluição de países do hemisfério Norte, e do desmatamento provocado pelo próprio Brasil”, resume o professor, Luiz Augusto Toledo Machado.
Isso porque a pesquisa mostrou que o impacto do desmatamento é mais intenso nos estágios iniciais. As maiores mudanças no clima local ocorrem já nos primeiros 10% a 40% de perda da cobertura florestal.
“Temos que preservar a floresta, isso fica muito claro. Não podemos transformá-la em outra coisa. Se houver algum tipo de exploração, precisa ser de forma sustentável”, afirma o professor do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG) da USP, Marco Aurélio Franco.
Sensível equilíbrio do ecossistema
A Amazônia, como a maior e mais biodiversa floresta tropical do mundo, tem um importante papel na regulação do clima global. É responsável, por exemplo, pelos chamados “rios voadores”. As árvores retiram água do solo por meio das raízes, transportam até as folhas e a liberam para a atmosfera em forma de vapor.
O desmatamento e os processos de degradação da floresta contribuem com a alteração desse ciclo de chuvas, provocando a intensificação da estação seca em escala local e aumentando os períodos de incêndios florestais.
A Amazônia brasileira perdeu 14% da vegetação nativa entre 1985 e 2023, de acordo com dados do MapBiomas, atingindo uma área de 553 mil km2, o equivalente ao território da França. A pastagem foi a principal causa no período. Mesmo chegando ao segundo menor nível de desmate entre agosto de 2024 e julho de 2025 (uma área de 4.495 km²), o desafio tem sido conter a degradação, especialmente provocada pelo fogo.
A estação seca – entre junho e novembro – é o período em que os impactos do desmatamento são mais pronunciados, principalmente sobre a chuva. Os efeitos cumulativos intensificam mais a sazonalidade.
Destrinchando os dados
Para chegar aos resultados, os cientistas usaram informações relacionadas à chuva e à temperatura, o grupo analisou dados de gases de efeito estufa. Concluiu que, ao longo do período de 35 anos, o aumento nas taxas de dióxido de carbono (CO₂) e de metano (CH₄) foi impulsionado praticamente pelas emissões globais (mais de 99%).
Foi observada uma alta de cerca de 87 partes por milhão (ppm) para CO₂ e cerca de 167 partes por bilhão (ppb) para CH₄.


Os pesquisadores alertam que, se o desmatamento continuar sem controle, a extrapolação dos resultados sugere um declínio adicional na precipitação total durante a estação seca e maior elevação da temperatura.
Estudos recentes indicam que o desmatamento na Amazônia já está alterando os padrões da monção sul-americana (fenômeno climático que leva chuvas abundantes para o centro e Sudeste do Brasil durante o verão), resultando em condições mais secas que podem comprometer a resiliência de longo prazo da floresta. Eventos extremos, como as secas de 2023 e 2024, só agravam a situação.