Pesquisadores da Embrapa propõem a criação de um observatório global da biodiversidade do solo, o Glosob, na sigla em inglês. O projeto é uma parceria com a Organização das nações unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO/ONU), e outras instituições internacionais.
Publicada na revista Nature Ecology and Evolution, a proposta visa estabelecer um sistema unificado e padronizado de monitoramento da biodiversidade do solo. Este abriga 59% de toda a biodiversidade mundial, e é altamente vulnerável às mudanças climáticas e ao mau uso da terra.
A intenção é padronizar indicadores e aprimorar as capacidades nacionais de monitoramento da biodiversidade do solo. Esta medida permitirá a formulação de políticas baseadas em evidências, facilitando avaliações globais.
O pesquisador George Brown, da Embrapa Florestas (PR), explica que, atualmente, há dois indicadores nas convenções internacionais que abordam os solos: um índice de agrobiodiversidade e outro de mudanças nos estoques de carbono orgânico do solo. “Eles não consideram a biodiversidade do solo nem as interações biológicas que regulam os ciclos biogeoquímicos e outras funções ecossistêmicas essenciais para a vida na terra”, declara o cientista.
Dessa forma, a intenção do Glosob é identificar pontos críticos de biodiversidade do solo para e garantir uma coleta de dados mais representativa e estratégica. Para isso, pretende priorizar os esforços de capacitação, para que todos o países, independente de recursos técnicos e financeiros possam contribuir.
“Hoje, nem todos têm capacidade para monitorar os organismos do solo, e diversas análises globais revelam que muitas regiões permanecem subestimadas”, aponta a pesquisadora Maria Elizabeth Correia, da Embrapa Agrobiologia (RJ), que também assina o artigo no periódico.


Os eixos de atuação do Glosob
A estruturação do Glosob, deve estar apoiada em cinco pilares. Estes são a padronização dos métodos para medir a biodiversidade do solo, a integração da biodiversidade em levantamentos convencionais e sistemas nacionais de informação, o aumento no apoio financeiro, institucional e de capacitação aos países, a conscientização sobre a importância dos organismos do solo e suas funções para o ecossistema e, por fim, a melhora na interação sobre biodiversidade, promovendo informações sobre melhores práticas, modelos econômicos e estruturas políticas legais projetadas para proteger e restaurar o ecossistema solo.
Além de padronizar os indicadores e variáveis, o monitoramento da biodiversidade do solo a partir do Glosob deve permitir análises mais acuradas em nível mundial. Dessa forma irá permitir a construção um mapeamento global da biodiversidade e de um banco de dados unificado.
“A partir desse observatório será possível identificar melhores práticas para a conservação do solo e uso de sua biodiversidade, bem como das suas contribuições para os serviços ecossistêmicos. Além disso, poderá ser um importante incentivo ao desenvolvimento de políticas públicas que abordem a saúde do solo, também garantindo que essa permaneça uma prioridade na governança ambiental global”, acredita Correia.
Outro diferencial da proposta é a abordagem colaborativa. Assim, o objetivo é envolver povos indígenas e o conhecimento tradicional, formuladores de políticas públicas, produtores agrícolas e especialistas técnicos no projeto.
Um comitê diretor de especialistas deverá acompanhar as iniciativas, de modo a avaliar realidades específicas de cada local. “Os esforços de capacitação, as salvaguardas legais e o alinhamento com os compromissos nacionais e internacionais aumentarão o engajamento, enquanto a colaboração contínua por meio de conselhos consultivos, plataformas digitais e gerenciamento adaptativo garantirá o sucesso a longo prazo”, escrevem os autores.
Próximos passos
A proposta do Glosob foi aprovada em 2024, na 12ª reunião do Global Soil Partnership da FAO. “Com a publicação do artigo na Nature, a divulgação será muito mais ampla, alcançando muitos atores nos âmbitos científico e político. Espera-se que isso provoque um efeito cascata de discussão sobre a importância da avaliação e do monitoramento da biodiversidade nos solos mundiais, e que os países signatários da Convenção da Biodiversidade (CBD) e participantes da reunião se organizem para colocar em prática a implementação do Glosob local e regionalmente”, aponta Brown.
Segundo ele, a expectativa é que, na próxima Conferência das Nações Unidas sobre Biodiversidade, a COP17, que será realizada em 2026, todos os países apresentem uma proposta de implementação para as decisões relacionadas à iniciativa da biodiversidade do solo, incluindo o Glosob. O plano de ação para a efetiva implementação da iniciativa envolve quatro etapas, com finalização prevista até 2030.
Para a pesquisadora Cintia Carla Niva, da Embrapa Suínos e Aves (SC), a Embrapa será grande aliada na implementação do monitoramento do Glosob no Brasil. “Nosso país se destaca entre os de clima tropical com expertise em biodiversidade do solo, e vários dos cientistas especialistas são da Embrapa”, argumenta. Brown concorda: “O know-how da Empresa na avaliação e monitoramento da biodiversidade do solo será importante para fomentar a capacitação necessária para a implementação do Observatório, não apenas localmente, mas também em nível internacional.”
*Sob supervisão de Luis Roberto Toledo