Com um prejuízo estimado em torno de R$ 180 milhões, o setor de cacau e derivados vê no aumento das tarifas um obstáculo à continuidade das exportações para os Estados Unidos. Em entrevista a Pryscilla Paiva, no Mercado & Cia, a presidente executiva da AIPC (Associação Nacional das Indústrias Processadoras de Cacau), Anna Paula Losi, afirmou que o cenário é bastante desafiador.
“Uma tarifa de 50% torna a nossa manteiga de cacau proibitiva para o mercado americano. Com isso, nossos importadores certamente buscarão outros fornecedores”, declarou Losi.
A executiva explicou que, apesar de o Brasil ser um país importador de cacau, o mercado interno não tem capacidade para absorver o volume atualmente destinado às exportações para os EUA.
“A gente calcula que, se as tarifas forem mantidas, a perda será de quase 10% na moagem de cacau no Brasil, ou seja, na atividade da indústria nacional. E aí vem a pergunta: ‘Mas o Brasil não tem cacau suficiente e precisa importar, então vai deixar de importar?’ Sim, muito provavelmente vamos reduzir a importação de amêndoas, porque não teremos mais para quem exportar os produtos derivados. Ao mesmo tempo, teremos um déficit de pó de cacau no mercado interno. Com a redução da moagem, a demanda pela amêndoa nacional também diminuirá. Ou seja, o impacto, que num primeiro momento atinge a indústria, acaba se espalhando por toda a cadeia produtiva.”
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Losi alertou ainda que, sem as exportações, a indústria brasileira de cacau corre o risco de ter que reduzir sua atividade produtiva:
“Temos um potencial gigantesco aqui no Brasil, mas infelizmente ainda não produzimos amêndoa suficiente para atender à demanda da indústria. Somente com cacau nacional, a nossa ociosidade média hoje é de quase 40%. Por isso, importamos cacau, industrializamos e exportamos, o que nos permite aumentar a produção, atender o mercado interno e o internacional. Se eu deixo de ter o mercado externo, preciso reduzir minha capacidade instalada, reduzir a moagem e, com isso, a operação de várias linhas de produção se torna inviável. Atualmente, temos uma capacidade instalada de cerca de 275 mil toneladas. Se operarmos somente com o que é produzido no Brasil, essa capacidade cairia para, no máximo, 200 mil toneladas.”
Além do impacto do tarifaço, o setor enfrenta outro desafio: a produção de cacau não tem conseguido atender à demanda, como relata Losi.
“Em 2024, tivemos muitas restrições na oferta, inclusive no mercado brasileiro. Não foi apenas uma escassez global. O recebimento de cacau não chegou a 180 mil toneladas, um volume muito abaixo do registrado em 2023. E agora, em 2025, ainda não vemos uma recuperação. O primeiro semestre de 2025 ficou muito próximo ao mesmo período de 2024, com cerca de 58 mil toneladas, o que representa aproximadamente um terço do necessário para atender à demanda do semestre”, explica.
“Por isso, as importações geralmente ocorrem no início do ano, quando a safra nacional é menor e a indústria precisa se abastecer com cacau importado para não parar. Para o segundo semestre, temos ouvido dos produtores que houve uma leve melhora, mas ainda assim a perspectiva é de que não ultrapassemos as 200 mil toneladas neste ano,ou seja, ainda estamos longe de alcançar o patamar necessário para utilizar plenamente a capacidade instalada da indústria”, complementa Losi.