O ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal (STF) Marco Aurélio Mello afirmou, em entrevista ao Arena Oeste desta quinta-feira, 14, que não se arrepende da decisão que concedeu habeas corpus ao traficante André Oliveira Macedo, o André do Rap, líder da facção Primeiro Comando da Capital (PCC).
A medida, tomada em 2020, resultou na soltura do traficante, que permanece foragido desde então. Perguntado se voltaria atrás no entendimento adotado à época, Mello respondeu: “De forma alguma, a atuação do juiz é uma atuação vinculada”.
Durante entrevista ao Arena Oeste, nesta quinta-feira, 14, o ex-ministro do STF Marco Aurélio Mello disse que não se arrepende de ter soltado o traficante André do Rap, líder do Primeiro Comando da Capital. pic.twitter.com/KHwhmfifde
— Revista Oeste (@revistaoeste) August 15, 2025
“O juiz não pode ver capa do processo, ele aplica a lei aprovada pelas duas casas do Congresso, a Câmara dos Deputados e o Senado da República”, disse Mello. Segundo o ex-ministro, o caso estava amparado por “preceito claríssimo do Código de Processo Penal” que prevê a revisão da prisão preventiva a cada 90 dias.
A prisão preventiva é a medida que inverte a ordem natural do processo criminal — em regra, a detenção ocorre depois de condenação definitiva. O ex-integrante do STF explicou que a renovação da preventiva pode ocorrer por iniciativa própria do juiz ou mediante pedido da polícia ou do Ministério Público.
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“No caso concreto, havia no processo a demonstração de que ele estava preso há mais de ano e a preventiva originária (…) não tinha sido renovada”, afirmou. Ele negou ter levado em conta quem era o réu: “O que fiz? Fui à capa do processo para ver o envolvido? […] Implementei a liminar. O faria hoje, se juiz, com a capa sobre os ombros novamente”.
Mello também declarou que deixou o Supremo “com um sentimento de dever cumprido” depois de mais de 30 anos na Corte. Relembrou que, em 2016, quando completou 70 anos, cogitou se aposentar, mas permaneceu em razão da aprovação da chamada “PEC da Bengala”, que elevou a idade limite para a aposentadoria compulsória no Judiciário.


“Ser magistrado é opção de vida e o magistrado não pode ver a capa do processo. O magistrado não está engajado em qualquer política governamental ou ter emoções, ter o abandono do princípio básico da administração pública, que é a impessoalidade”, disse.
A decisão que beneficiou André do Rap foi posteriormente derrubada pelos demais ministros do STF, mas o traficante já havia deixado a penitenciária e não foi mais localizado. Mello avalia que “é possível que ele já esteja a sete palmos”.
Condenado a 25 anos de prisão em outros dois processos, André do Rap já havia fugido anteriormente, entre 2014 e 2019, até ser preso em uma mansão em Angra dos Reis (RJ). Na ocasião, a polícia estimou que ele ostentava patrimônio de R$ 17 milhões, supostamente oriundo do tráfico.
Natural de Santos (SP), André viajava com frequência para a Costa Verde do Rio de Janeiro e para Jacarepaguá, na zona oeste do Rio, onde mantinha negócios. Depois ser batizado no PCC em 2005, passou a integrar o setor conhecido como “Sintonia do Tomate”, responsável pelo tráfico internacional de drogas da facção.
“O juiz não pode ver capa do processo, ele aplica a lei”, disse o ministro, que justificou a decisão com base técnica. Mello afirmou que, de acordo com a legislação, a prisão preventiva de um réu deve ser revisada a cada 90 dias. No entanto, o faccionado estava “preso há mais de um ano”, lembrou.
Apresentado por Silvio Navarro, a bancada desta edição conta com Cristyan Costa, repórter especial de Oeste; Marina Helena, comentarista de Oeste; Lucas Saba, editor da Gazeta do Povo; e Tiago Pavinatto, jurista e articulista de Oeste.
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