Um grupo de 38 deputados do Parlamento Europeu, em sua maioria ligados a partidos de direita e centro-direita, enviou uma carta à presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, com um pedido de adiamento e revisão de diversas exigências da nova lei ambiental da União Europeia, prevista para entrar em vigor no início de 2026.
Na carta, datada de 14 de maio, os parlamentares reconhecem a importância dos objetivos ambientais de combater o desmatamento e a degradação florestal, mas argumentam que a legislação é tecnicamente inviável e cria desequilíbrios concorrenciais entre os próprios importadores do bloco, o que prejudica especialmente pequenas e médias empresas.
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“A regulamentação introduz exigências administrativas extensas e impõe demandas tecnicamente irrealistas para rastrear e verificar a origem de commodities, expectativas especialmente difíceis de cumprir no contexto de cadeias globais de abastecimento”, afirmam os deputados no documento. A apuração é do jornal Folha de S.Paulo.


Segundo os parlamentares, pequenos e médios negócios seriam desproporcionalmente afetados, “por não possuírem os recursos humanos e financeiros para cumprir com tais obrigações complexas, frequentemente tendo que recorrer a consultores caros e sistemas de tecnologia da informação”.
Diante disso, os parlamentares pedem que a comissão adie a implantação plena da lei até que os principais entraves técnicos e jurídicos sejam solucionados. O apelo partiu de representantes de dez países, como República Tcheca, Itália, Alemanha, França, Bélgica e Países Baixos, com filiações majoritárias aos grupos ECR (conservador), EPP (centro-direita) e Renew Europe (liberal).
Brasil e Mercosul foram contra lei ambiental europeia
A lei europeia foi aprovada em meados de 2023, com previsão inicial de vigência para dezembro de 2024, mas já teve sua aplicação adiada em um ano devido a pressões internacionais — entre elas, do Brasil e de países do Mercosul. Pelo cronograma atual, grandes empresas devem se adequar até 30 de dezembro, enquanto micro e pequenas empresas têm prazo até 30 de junho de 2026.
O Parlamento Europeu desempenha um papel significativo na vida dos cidadãos dos países membros da União Europeia (são 27 países).
Entre outras coisas, o grupo cria leis que regulam o mercado europeu (normas sobre concorrência, normas técnicas, direitos do consumidor,… pic.twitter.com/sB05iIerFL
— Rodrigo da Silva (@rodrigodasilva) June 10, 2024
Ursula Von der Leyen ainda não se manifestou sobre a carta. A regulamentação exige rastreabilidade total e localização exata da origem de produtos como carne bovina, madeira e derivados, o que impõe desafios operacionais inclusive para exportadores europeus.
Os parlamentares também criticam a ausência de uma lista oficial e transparente de países considerados de “baixo risco” e apontam o risco de insegurança jurídica e interpretações conflitantes entre os países integrantes da União Europeia (UE).
Além de pleitearem o adiamento, os deputados pedem a criação de mecanismos simplificados de verificação para pequenas e médias empresas e a reavaliação dos critérios de rastreabilidade. Também cobram a retomada da proposta de criar a categoria de “países de risco zero” — aprovada pelo Parlamento Europeu em novembro de 2024, mas rejeitada posteriormente pela comissão e por alguns países.


Lei “antidesmatamento” impacta cadeia de produção
O pedido já teve repercussão política. No fim de maio, o Conselho de Ministros da Agricultura da UE voltou a discutir o tema, sob pressão dos governos da Áustria e Luxemburgo, com apoio dos Estados Unidos.
No Brasil, o tema é acompanhado de perto pelo Ministério da Agricultura e Pecuária, devido ao impacto direto sobre as exportações nacionais, especialmente de soja, carne e madeira. O país foi classificado como de “risco médio” quanto ao desmatamento.
A Presidência da República manifestou “preocupação” com a legislação europeia e adotou um tom crítico. Governo federal e bancada ruralista, em uma rara convergência, defendem a aplicação de exigências equivalentes também aos produtores europeus, com base na Lei 15.122/25, que estabelece o princípio da reciprocidade regulatória nas relações comerciais internacionais.
Ruralistas trogloditas…não, é o governo Lula criticando a política ambiental da Europa!!!
E agora Marina Silva, agora tá certo?! pic.twitter.com/rl87UK0vSk— Xico Graziano (@xicograziano) September 8, 2023
“Sejam mecanismos legais ou voluntários, públicos ou privados, nacionais ou internacionais, a convergência com a meta brasileira de desmatamento zero em todos os biomas até 2030 é necessária”, declarou o governo em nota. “A preocupação com a inclusão social, sobretudo em relação às pequenas empresas exportadoras e importadoras e proprietários rurais é fundamental.”
O texto acrescenta que países desenvolvidos preocupados com a preservação das florestas brasileiras devem contribuir financeiramente para essa meta, “promovendo incentivos econômicos e mecanismos de mercado para os países, as empresas e proprietários que conservem suas florestas para além da legislação nacional”.
A Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) reforçou que a legislação brasileira agora exige que produtos agropecuários importados sigam os mesmos padrões sanitários, ambientais, trabalhistas e de rastreabilidade impostos à produção nacional.


“A medida foi uma resposta estratégica a barreiras regulatórias como o regulamento antidesmatamento da União Europeia, que impõe critérios unilaterais e desproporcionais ao agronegócio brasileiro”, afirmou a entidade.
A FPA também destacou que a reciprocidade não é uma barreira ao comércio, mas uma forma de garantir justiça, soberania e isonomia nas relações comerciais. “Se o Brasil precisa cumprir exigências rigorosas para exportar, é legítimo exigir o mesmo padrão de quem deseja acessar o mercado nacional.”
Embora a nova legislação europeia não imponha diretamente obrigações a países terceiros como o Brasil, ela condiciona a entrada de produtos no mercado europeu à comprovação de que não estão ligados ao desmatamento. Isso obriga produtores, exportadores e tradings brasileiros a fornecerem informações detalhadas sobre origem, localização e conformidade legal.
Na prática, toda a cadeia de exportação é afetada, mesmo que a responsabilidade formal recaia sobre as empresas europeias.