A dívida da Venezuela com o Brasil superou a marca dos R$ 10 bilhões. Desde 2018, quando Caracas entrou em inadimplência, os juros acumulados se aproximaram dos R$ 3 bilhões. Os dados mais recentes, obtidos por meio do Ministério da Fazenda, referem-se a valores contabilizados até 28 de fevereiro de 2025.
Essas cifras abrangem indenizações pagas pela União aos bancos financiadores e encargos moratórios. Contudo, o passivo pode ser ainda maior. Estimativas mostram que a dívida total esteja entre US$ 1,7 bilhão e US$ 2,5 bilhões — cerca de R$ 12 bilhões, considerando a cotação de R$ 5,42 registrada em 4 de julho.


O calote venezuelano envolve contratos de financiamento de exportações brasileiras, principalmente em projetos de infraestrutura no país vizinho, como construção de metrôs, estaleiros e siderúrgicas.
Esses financiamentos contaram com a cobertura do Seguro de Crédito à Exportação (SCE), garantido pelo Fundo de Garantia à Exportação (FGE), operado pela União para proteger empresas exportadoras brasileiras em casos de inadimplência de países compradores.
+ Leia mais notícias de Política em Oeste
De acordo com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), os recursos foram liberados no Brasil diretamente aos exportadores. A instituição financeira alega que as prestações não pagas pela Venezuela foram “integralmente indenizadas pelo SCE” e que o saldo remanescente foi transferido para a União. O último pagamento de indenização ocorreu em junho de 2025.
Mesmo assim, a dívida da Venezuela segue aumentando. Nos primeiros dois meses do ano, o estoque subiu R$ 960 milhões, segundo o Ministério da Fazenda. Esse crescimento decorre tanto da falta de pagamento das parcelas cobertas pelo seguro — ainda havia quatro prestações a vencer até junho — quanto dos juros de mora, que continuam a ser aplicados até a liquidação.
O calote teve início formal em 2018, mas os contratos datam do começo dos anos 2000. Envolvem operações de comércio exterior e apoio oficial do governo brasileiro para investimentos em infraestrutura.


Venezuela ignora cobranças
Desse total, cerca de US$ 1,5 bilhão se refere a grandes empreendimentos, como o metrô de Caracas. Quando a Venezuela deixou de pagar, o FGE cobriu os valores devidos aos bancos, mas a conta acabou sendo transferida ao Tesouro Nacional.
O Ministério da Fazenda informou que vem cobrando Caracas formalmente por meios diplomáticos e também em contatos diretos com o Ministério da Economia da Venezuela. Legalmente, não é permitido perdoar a dívida, mas existem mecanismos de reestruturação judicial — ainda que com chances pequenas de êxito.


O Ministério da Fazenda também esclareceu que não existe prazo definido para pagamento ou renegociação. “A mora é uma penalidade: os valores seguirão aumentando até que haja negociação ou quitação”, diz o documento oficial. “Sem a colaboração da Venezuela, não é possível prever quando isso se resolverá.”
Além do Brasil, a Venezuela acumula dívidas com outros credores. Também existem débitos regionais, referentes a contratos de fornecimento de petróleo para países do Caribe, incluindo Cuba e Haiti.
O BNDES reforçou que, conforme suas normas internas, não pode conceder novos financiamentos a países inadimplentes. A atribuição para conduzir a recuperação desses créditos está, desde o começo de 2024, sob responsabilidade da Secretaria de Assuntos Internacionais do Ministério da Fazenda.
Calote à vista
Em junho deste ano, durante viagem à França, Lula voltou a defender a transformação de dívidas em investimentos ou em emissão de Direitos Especiais de Saque (DES), recurso do FMI criado em 1969 para reforçar a liquidez de economias em crise.
O DES não configura dívida, mas segue regras de uso e resgate definidas pelo Fundo, envolvendo moedas fortes como dólar, euro e libra.
Em 2024, Lula já havia defendido mecanismos multilaterais para trocar dívidas por investimentos em educação, argumento que repetiu em artigo no jornal O Globo em parceria com a diretora-geral da Unesco, Audrey Azoulay.
Leia também: “O êxodo venezuelano”, reportagem de Cristyan Costa publicada na Edição 276 da Revista Oeste

