Avenida Vicente Machado, principal via de Ponta Grossa, teve implementação de cabeamento subterrâneo no governo de Wosgrau –
De todas as vias e avenidas iluminadas de Ponta Grossa, as únicas que dispensam da necessidade de fios aéreos são a avenida Doutor Vicente Machado, e as ruas Balduíno Taques, Coronel Cláudio e Fernandes Pinheiro, onde fica o “Calçadão”, cuja fiação subterrânea foi implementada no terceiro mandato (2009-2012) de Pedro Wosgrau Filho (PSDB).
Desde então, o último projeto pensado para a realocação dos fios aéreos para o subsolo foi na gestão de Marcelo Rangel (PSD), em 2018. À época, o Jornal da Manhã trouxe informações sobre o anúncio do investimento de R$ 12 milhões para a revitalização da avenida Ernesto Vilela. “As obras, ainda sem data definida para o início, irão contemplar modernização viária, implantação de cabeamento subterrâneo e iluminação com lâmpadas de LED”, diz a publicação do JM. Entretanto, sete anos após a divulgação da obra, a implantação de cabeamento subterrâneo não foi realizada.
Com o objetivo de compreender se este tipo de alteração na infraestrutura urbana de Ponta Grossa é uma prioridade da atual gestão, liderada pela prefeita Elizabeth Schmidt (União), a equipe de Jornalismo do Portal aRede/JM questionou a Prefeitura Municipal de Ponta Grossa (PMPG) sobre sua visão acerca do assunto. Em resposta, o órgão declarou que o foco está em outras frentes de trabalho para a melhoria da estrutura da cidade.
PRIORIDADES – “No momento histórico pelo qual passa o município, o foco de curto prazo da administração municipal está ajustado para a otimização dos investimentos na infraestrutura urbana de pavimentação, conexões logísticas e ligações interbairros, visando a criação de rotas alternativas para o trânsito, melhorias na mobilidade e da qualidade de vida da população que mora defronte a vias que ainda não estão pavimentadas”, explica o Poder Executivo sobre sua prioridade neste período.
Embora o órgão compreenda as vantagens da alteração na infraestrutura pelo ponto de vista urbanístico, a realização de projetos de cabeamento subterrâneo apresentam desafios à Prefeitura, como o alto custo de implementação e a necessidade de parcerias com terceiros. Portanto, a médio e longo prazo, o seu foco também não seria este tipo de obra, mas sim, intervenções urbanas que visam sanar vulnerabilidades do ponto de vista climático, como alagamentos e deslizamentos, além de propor a criação de novos parques e lagos no município.
Rafael Mansani, presidente do Iplan, diz que obra exige grandes investimentos, e para executar o projeto da fiação subterrânea, é preciso criar um novo cronograma | Foto: Arquivo aRede.
Procurados pela reportagem, o secretário de Serviços Públicos, Eduardo Marques, e o presidente do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Ponta Grossa (Iplan), Rafael Mansani, explicaram o porquê deste posicionamento conjunto à Prefeitura. “Se tentarmos executar diversas obras ao mesmo tempo, corremos o risco de cair na morosidade para o cumprimento de 100% da pavimentação, visto que seria necessário criar um novo cronograma para as obras da fiação subterrânea”, diz Mansani.
O secretário de Serviços Públicos reforça o posicionamento com relação aos projetos em andamento no município. “Nosso objetivo agora é proporcionar maior conforto e segurança, tanto para pedestres quanto para veículos, otimizando a mobilidade urbana. Mas, com certeza, vamos analisar possibilidades para que a gente possa ter mais avenidas com este benefício”, explica Marques, que também apontou que a implementação de projetos dessa natureza exige uma parceria com a Companhia Paranaense de Energia (Copel), responsável pela gestão da rede elétrica e de telecomunicações, incluindo postes e fios.
Eduardo Marques, secretário de Serviços Públicos de Ponta Grossa, afirma que é possível analisar possibilidades para implementar o modelo subterrâneo. | Foto: Arquivo aRede.
Em nota enviada via assessoria de comunicação, a Copel explica que a implantação de redes subterrâneas segue as diretrizes da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), e é classificada como obra de responsabilidade do solicitante, que arca integralmente com os custos de projeto e execução. “Como distribuidora, a Copel estabelece as normas técnicas e realiza a operação e manutenção de redes subterrâneas, assegurando a segurança e a confiabilidade do sistema elétrico. Também oferece orientação técnica para que as obras sigam os padrões exigidos”, esclarece a empresa.
O QUE DIZ A LEI – No atual contexto da cidade, não há nenhuma legislação vigente que proponha o enterramento dos cabos de telecomunicação visando o uso de fiação subterrânea. A antiga Lei n.° 12.611, de 05 de setembro de 2016, que obrigava a disponibilização da planta de conjuntos habitacionais para a implantação subterrânea de cabeamento elétrico, foi revogada pela Lei n.° 14.468, de 1º de dezembro de 2022, que removeu esta regulamentação, e, consequentemente, extinguiu a proposta para novos loteamentos no município.
Fiação aérea próxima a janelas e varandas na rua Santos Dumont, no Centro de Ponta Grossa | Foto: Gabriel Miguel/aRede.
Entretanto, outras normativas do município dispõem exclusivamente sobre a qualidade da fiação aérea, a exemplo da Lei n.º 14.686, de 07 de julho de 2023, que regulamenta a retirada de fios em excesso ou sem uso em postes da cidade, assim como a ruptura ou queda de fios. Em pesquisa para a reportagem, a equipe de Jornalismo identificou situações como essa ao longo da rua XV de Novembro, localizada no Centro da cidade, próximo de prédios públicos como o Museu Campos Gerais da Universidade Estadual de Ponta Grossa (MCG-UEPG) e do Cine-Teatro Ópera.
A mesma rua conta com diferentes tipos de iluminação, como explica Henrique Zulian, arquiteto e urbanista. “Houve uma reforma simplória anos atrás em que se instalaram postes de luz com fiação terrestre, porém mantiveram os postes enormes de iluminação de avenida e toda a sua fiação, completamente descaracterizados com a escala e vocação da rua. Ali não cabe apenas uma ocultação da fiação, mas sim um pensamento global de reforma e readequação do espaço urbano“.
Ainda que os benefícios e potencialidades do uso da fiação subterrânea sejam reconhecidos no desenvolvimento da cidade, a Prefeitura esclareceu não ter este tipo de obra como prioridade. O problema da fiação aérea, que concerne estruturas de telecomunicação e energia, atravessa outras questões como arborização, segurança e a estética, mas, na gestão de Elizabeth, outras demandas da infraestrutura foram listadas a ser solucionadas até o fim de seu governo.
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Regiões com projeto subterrâneo têm maior valor comercial em PG
Aterramento de fios traz impactos positivos na facilidade de manutenção, maior sustentabilidade e diminuição do risco de incidentes
“Seja em Ponta Grossa, ou qualquer outra cidade, a fiação aérea modela diretamente a paisagem urbana”, diz Henrique Zulian, arquiteto e urbanista, ao ser questionado sobre o impacto deste tipo de fiação na qualidade do espaço público e experiência do morador ponta-grossense. “A poluição visual é intensa, compete com edificações antigas, gera ruído e dá uma sensação de desorganização. A qualidade estética do espaço urbano é seriamente afetada, parecendo menos seguro, cuidado, moderno e limpo”, diz.
O problema da fiação aérea não é somente visual, e, durante a produção da reportagem, moradores contaram à Redação sobre situações incômodas e frequentes. Entre as demandas compartilhadas por populares, está o medo de quedas e desgaste dos fios durante períodos de chuva, principalmente em áreas próximas de árvores, que colidem contra os fios com a força dos ventos, bem como o furto dos cabeamentos ou curtos-circuitos devido ao emaranhado em frente às residências.
Henrique Zulian, arquiteto e urbanista, e conselheiro do Grupo aRede, detalha benefícios do modelo de fiação para o município. | Foto: Arquivo aRede.
Zulian aponta que este problema expõe um risco à segurança da população. “Em imóveis com árvores nas proximidades, é preciso realizar podas que, muitas vezes, fragilizam seus galhos para que ela não atrapalhe a fiação, entretanto, isto a torna mais frágil. Casas com janelas e varandas voltadas a estas fiações são desvalorizadas, além da pouca visibilidade, existem riscos à segurança com fios soltos, cabos caídos e transformadores volumosos e barulhentos”, opina o arquiteto.
FISCALIZAÇÃO – Ainda que as ruas em que o modelo de fiação subterrânea sejam localizadas na região central da cidade, é preciso otimizar e mitigar estes problemas, conforme opinião de Fabiano Gravena, diretor de Urbanismo da Associação Comercial, Industrial e Empresarial de Ponta Grossa (Acipg). “É uma obra de grande porte, então, acredito que poderia iniciar nas regiões centrais, onde o passeio muitas vezes é mais estreito, e toda a população frequenta, por ser um aglomerado comercial”, diz.
Nos bairros, a fiscalização sobre os perigos da fiação desgastada precisa ser mais eficaz, opina Gravena. “Pode e deve haver, por parte do poder público, uma fiscalização à parte, promovendo uma limpeza, adequação e manutenção desta rede. Por exemplo, substituir um número de fios por apenas um cabo. Além disso, é preciso rever a localização dos postes. Muitos estão rente ao meio-fio, e são mais suscetíveis a causar acidentes de ônibus e caminhões. Estas alterações podem ser feitas por um custo não tão elevado quanto a implantação de fios subterrâneos”, expressa o diretor de Urbanismo.
Fabiano Gravena, diretor de Urbanismo da Associação Comercial, Industrial e Empresarial de Ponta Grossa (Acipg), opina que obras de aterramento dos fios poderia seguir pela região central da cidade. | Foto: Arquivo aRede.
DESENVOLVIMENTO – Para o setor imobiliário, estas propostas são atrativas aos moradores. Carlos Tavarnaro, vice-presidente do Sindicato da Habitação e Condomínios (Secovi), concorda que as ações de melhorias na qualidade da fiação da cidade devem iniciar pela região central. “Precisamos priorizar as avenidas de maior fluxo de pessoas e veículos, para, em seguida, passar para outras regiões descentralizadas. A implantação de cabeamento subterrâneo traria um impacto muito positivo, se tratando de poluição visual, facilidade de manutenção e menor risco de incidentes”, diz Tavarnaro, que salienta também a relevância estética deste tipo de infraestrutura. “A visibilidade dos imóveis melhora bastante com o cabeamento subterrâneo, e o aspecto do local em geral, também. Isto é perceptível quando comparada a fiação aérea com locais em que este aterramento já foi feito”.
Vice-presidente do Sindicato da Habitação e Condomínios (Secovi), Carlos Tavarnaro aponta impacto positivo de cabeamento subterrâneo na valorização de imóveis da cidade | Foto: Arquivo aRede.
A reportagem também buscou entender a opinião analítica deste tipo de obra com o Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (Crea) no município. Luiz Gustavo Barbur, inspetor do órgão, aponta que este tipo de obra deve partir da decisão do gestor público ao verificar a demanda por parte da sociedade. “Os custos envolvidos são grandes: abrir valetas, fazer as contenções necessárias, recompor pavimento, calçadas, interrupção de trânsito. Além disso, no modelo subterrâneo, as normativas de segurança ficam mais rigorosas, pois os cabeamentos de alta e baixa tensão, junto aos de telecomunicações, teriam um espaço mais reduzido de distância”, explica.
O inspetor do Crea reforça que, na fiação aérea, se entende que há uma certa distância entre os fios, entretanto, a exemplo da formação de emaranhados e quedas de galhos de árvores nos cabos, passam a se tornar problemas aos moradores. “Especialmente no que se trata da arborização das vias, uma vez que inúmeras interrupções de fornecimento se dão por conta deste tipo de conflito”.
Esquina das ruas Custódio de Melo com Barão de Teffé, em área residencial, mostra fios aéreos sobre as casas. | Foto: Gabriel Miguel/aRede.
PRIORIDADE DE OBRAS – Procurada pela equipe de Jornalismo do Portal aRede/Jornal da Manhã, a Prefeitura Municipal de Ponta Grossa reconhece que a obra seria “uma opção importante do ponto de vista urbanístico, geradora de efeitos positivos quanto à manutenção e qualidade da paisagem urbana”. Entretanto, o Poder Executivo não considera a realização deste tipo de projeto como uma alternativa viável ao município neste momento. “Queremos garantir pavimentação na casa de todos os ponta-grossenses, entregando à população uma infraestrutura que se sobrepõe aos potenciais benefícios de uma rede subterrânea de cabos”, explica.
Os pontos positivos e desafios da implantação deste tipo de obra são avaliados por especialistas do planejamento urbano na cidade, que, além de tudo, são moradores de Ponta Grossa. O desafio principal da fiação subterrânea é, sem dúvida, o custo do projeto, além da necessidade de construir um cronograma para as obras e revisar normativas com as concessionárias. Porém, ficam destacados os ganhos para o município com início ao reforço da fiscalização das fiações aéreas, como a retirada de excessos, emaranhados e cabos cortados, o que garante mais segurança aos ponta-grossenses e projeta a cidade para um desenvolvimento mais moderno e sustentável.
Outras cidades do Brasil, a exemplo de Guarujá (SP), Ouro Preto (MG), Gramado (RS) e Lages (SC), inovam ao trazer legislações e normativas que focam em promover esta mudança em infraestrutura que passam das áreas centrais da cidade, buscando alcançar, também, regiões turísticas e áreas descentralizadas. Guarujá, em novembro deste ano, estenderá a mudança por toda a cidade, incluindo fios de energia elétrica, telefonia, internet, TV a cabo e fibra óptica.


