Em editorial publicado na edição desta segunda-feira, 14, a Gazeta do Povo — jornal paranaense que considera que “o Brasil já não vive uma experiência democrática”, em razão da supressão de direitos fundamentais como a liberdade de expressão e o devido processo legal — afirma que a deterioração da democracia ocorreu por ação, mas também por omissão.
“As democracias se extinguem quando seus elementos constitutivos são eliminados ou enfraquecidos, como explicamos em ocasião anterior. Não se trata apenas de eleições — até ditaduras escancaradas as realizam —, mas daquilo que chamamos ‘Estado de Direito’ e ‘império da lei’. Um desses elementos é o sistema de freios e contrapesos, pelo qual um poder tem a atribuição constitucional de podar os excessos cometidos por outros poderes. Quando este sistema falha, o poder que não é devidamente freado tende a expandir seu poder cada vez mais. Se o caso brasileiro é de ‘um superpoder (o Judiciário) livre para fazer, reescrever e ignorar leis para impor as próprias vontades e perseguir grupos político-ideológicos de cidadãos’, é preciso olhar para seu contrapeso constitucional, o Legislativo.”
Para o jornal, o problema da derrocada da democracia brasileira não está no sistema de freios e contrapesos, mas “na covardia daqueles que, tendo a obrigação de ser o contrapeso, se omitem”.
+ Leia mais notícias de Política em Oeste
A Gazeta faz uma “reprimenda especial” ao Senado. “Se a lista de crimes de responsabilidade dos ministros do Supremo, que consta do artigo 39 da Lei 1.079/50, fosse uma cartela de bingo, alguns dos membros da suprema corte já a teriam preenchido toda nesses últimos anos.”
A Lei dos Crimes de Responsabilidade enumera, como causas para a perda do cargo de ministro do STF, ações como atividade político-partidária. Veja o que diz a lei:
Art. 39. São crimes de responsabilidade dos Ministros do Supremo Tribunal Federal:
1- altera, por qualquer forma, exceto por via de recurso, a decisão ou voto já proferido em sessão do Tribunal;
2 – proferir julgamento, quando, por lei, seja suspeito na causa;
3 – exercer atividade político-partidária;
4 – ser patentemente desidioso no cumprimento dos deveres do cargo;
5 – proceder de modo incompatível com a honra dignidade e decôro de suas funções.
Dezenas de pedidos de impeachment de ministros do STF, fundamentados nessa lei, foram protocolados no Senado, mas todos estão engavetados. Um deles foi protocolado contra o atual presidente da Corte, Luís Roberto Barroso, por ter declarado publicamente que “nós derrotamos o bolsonarismo”. A sentença foi entendida como uma clara confissão de atividade político-partidária, embora o ministro negue.


“É à câmara alta do Congresso que cabe a tarefa de julgar e cassar os ministros do STF, e denúncias enviadas ao presidente do Senado não têm faltado”, explica a Gazeta. “Mas Rodrigo Pacheco (PSD-MG) não fez absolutamente nada a respeito entre 2021 e 2024, quando presidiu o Senado; seu sucessor, Davi Alcolumbre (União-AP), já afirmou que um processo de impeachment de um ministro do Supremo ‘vai causar problema para 200 milhões de brasileiros’ — como se a remoção de alguém que claramente comete crimes de responsabilidade e se comporta como governante absoluto do Brasil fosse um problema, e não uma solução.”
Gazeta expõe o papel da CPI do Abuso de Autoridade na restauração da democracia
O jornal também menciona o pedido de CPI do Abuso de Autoridade, que poderia “jogar luz, em rede nacional, sobre todos os abusos cometidos ao longo dos últimos anos pelo Supremo”. O requerimento protocolado na Câmara cumpriu todos os requisitos constitucionais para sua instalação, mas foi engavetado quando Arthur Lira (PP-AL) presidia a Câmara e “segue dormindo” na gaveta de Hugo Motta (Republicanos-PB).
A Gazeta conclui o texto com a afirmação de que “o Brasil tem, portanto, uma ‘via rápida’ para restaurar a democracia: basta que o Congresso reaja e faça o que deve ser feito”. Mas isso depende necessariamente “de a maioria acovardada despertar o quanto antes e cumprir seu papel — ou, então, de ser substituída em 2026 por novos parlamentares que tenham espinha dorsal”.