As tarifas de 50% para produtos brasileiros exportados para os Estados Unidos (EUA) entraram em vigor no último dia 6 e, poupando quase 700 produtos, ainda não geraram o impacto esperado. O dólar se mantém em queda e as exportações em julho renderam 48% a mais do que o mesmo mês no ano passado.
+ Leia mais notícias de Economia em Oeste
No dia 10 de julho, quando o presidente Donald Trump anunciou o aumento para 50%, o mercado reagiu de forma pessimista. O Ibovespa futuro com vencimento em agosto de 2025 (INDQ25) fechou em queda de 2,44 e o dólar futuro com vencimento no mesmo prazo teve salto de 2,30%.


Alguns fatores têm explicado esta situação, entre eles as expectativas de corte de juros nos EUA, depois de o Federal Reserve (Fed), Banco Central dos EUA, indicar uma desaceleração do mercado de trabalho no país, o que provocaria um corte nos juros.
Isso contribui para a valorização do real diante do dólar, já que, com a queda dos juros, a atratividade por ativos em dólar diminui.
Isso, no entanto, não é suficiente, segundo Paulo Serra, especialista em Financiamento de Infraestrutura, Regulação e Gestão de Parcerias Público-Privadas (PPPs), pela Universidade de Harvard (EUA). Serra é filiado ao PSDB, tendo sido prefeito de Santo André (SP) entre 2017 e 2024.
“Muita gente está dizendo que o mercado brasileiro está resistindo bem à alta das tarifas dos EUA”, afirma Serra a Oeste. “É verdade, mas essa resistência tem prazo de validade. Hoje, ainda temos estoques, contratos e um câmbio que ajudam a amortecer o impacto. Mas se nada for feito, em três a seis meses, os efeitos começam a aparecer: custos mais altos, perda de competitividade e compradores buscando outros fornecedores.”
Os fatores que mantêm o dólar controlado neste momento, segundo ele, não podem servir como referência.
“E aqui está o ponto: não podemos achar que só a queda ou a estabilidade do câmbio vão resolver”, observa o economista. “O câmbio é como um amortecedor — ajuda, mas não é política econômica. Ele muda rápido, e se virar contra, o problema dobra.”
O interesse de investidores e os bons resultados de algumas empresas também têm ajudado, segundo o economista Marco Saravalle, mestre em Economia e Finanças pela Fundação Getulio Vargas de São Paulo.
“O mercado está entendendo que as companhias, principalmente elas, continuam muito saudáveis, com expansão de lucro em 2023 e 2024, assim como em 2025.”
Ele ressalta, porém, que as ações do Fed será determinante para a reação do mercado brasileiro nos próximos meses.
“Em abril, os bancos chegaram a precificar uma probabilidade muito alta de recessão nos EUA, mas depois de maio e junho essa probabilidade diminuiu bem, chegou até a ser descartada”, observou. “Então é isso que o mercado está entendendo.”
A expectativa, neste sentido, é para o chamado “mandato duplo”, lembrado por Valle. Ele considera que a economia norte-americana tem demonstrado um certo equilíbrio e isso ajuda na estabilização, em geral, de outros mercados.
“Nos EUA, a inflação tem se tornado mais bem comportada ao longo desses últimos meses e, de certa forma, estamos vendo uma atividade econômica que, mesmo menos aquecida nos EUA, está longe da recessão.”
O financista Lucas Borges, especialista em Private Equity pela Harvard Business School e em Financial Accounting pela London School of Business and Finance, prefere analisar também pelo prisma dos juros elevados no Brasil. Isso mantém o fluxo de capital externo no curto prazo.
“Devido a isso, estamos vendo um câmbio, hoje, que não desvalorizou, algo que seria natural com a insegurança e a instabilidade atuais.”
Borges também cita a existência de estoques e contratos já firmados, que amortecem o impacto imediato sobre as exportações. Mas, como Serra, alerta para a possível inconsistência deste momento.
“Esta resistência tende a ser temporária”, alerta o financista. Ele acredita que em poucos meses, é provável que os efeitos mais concretos comecem a aparecer, especialmente nos setores diretamente atingidos, como a agroindústria, a siderurgia e as cadeias que dependem desses segmentos.
“O tempo exato vai depender da duração das tarifas, da força do consumo e da diversificação de mercados.”
China como opção à alta das tarifas dos EUA
A opção pela China também não deve ser solução, segundo Lucas Borges. Ele afirma, para tanto, que as exportações brasileiras para os EUA são, em grande parte, de produtos finais e de maior valor agregado.
“Países como a China não têm o mesmo perfil de consumo, nem uma população com o mesmo poder de compra, o que dificulta uma substituição comercial equivalente.”
É hora de o governo federal agir com dinamismo e eficiência, na opinião dele. Antes que os prejuízos comecem a aparecer.
Leia mais: “Entram em vigor tarifas de 50% impostas pelos EUA a produtos do Brasil”
“Se houver prolongamento das tarifas sem medidas compensatórias internas ou novas aberturas comerciais, a tendência é que a resiliência se esgote de forma rápida e gradual, com impacto mais visível no comércio exterior, no câmbio e no emprego ligado à exportação.”
Assim como Serra, Borges considera que não é conveniente se basear na atual estabilidade do preço do dólar, já que o mercado de câmbio é volátil, muito mais consequência do que referência de política econômica.
“Contar exclusivamente com um câmbio estável ou em queda para mitigar o impacto das tarifas não é estratégia robusta”, afirma Borges, que completa.
“A taxa de câmbio é altamente sensível a fatores externos, como decisões do Federal Reserve, crises geopolíticas ou mudanças bruscas no apetite ao risco. Fatores internos, como instabilidade política ou fiscal e possíveis novas retaliações por parte dos EUA podem, ainda, desvalorizar a moeda.”