Não tenho constatações para dizer que grupo suspeito de comprar sentenças montou fraudes em recuperações judiciais (RJ) no agronegócio. Mas indícios de uma “indústria” de RJ no agro prejudicará o setor, sem dúvida.
Os ciclos dos preços das commodities ao longo da história são clássicos. Aprendi com Shunji Nishimura, fundador da Jacto, com quem tive meu primeiro emprego no agro, a seguinte lição: “Quando tudo vai bem, se prepara para ir mal; quando tudo vai mal, se você está preparado, irá bem”. E para esse sábio mentor estar preparado significava duas coisas: investimento em inovação e segurança financeira no caixa.
Tivemos abruptos aumentos das commodities no período da covid-19 e, após, o recuo. E ciclos contrastantes – os insumos não diminuíram de preços, os custos e as mercadorias sim, com exceções. Em paralelo a isso, aspectos na gestão fiscal do país, valor dos juros elevados para a atividade agrícola, guerras tarifárias, etc., e também como conversei com o economista chefe da Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul), Antônio da Luz, sempre nos relembra a importância sagrada da gestão na atividade.
Então, sobre o crescimento acentuado de pedidos de RJ no agro, trago aqui a opinião do economista chefe da Farsul, Antônio da Luz:
“Nós entendemos que as recuperações judiciais são um direito do produtor. Aliás esse é um direito que não veio de graça, foi conquistado, inclusive com o envolvimento das entidades, os representantes, etc. Porque não era possível que todo mundo tivesse esse direito e o produtor, não. Quantas vezes os produtores depositaram os seus grãos e depois uma empresa pediu RJ e tiveram prejuízos? A RJ foi conquistada porque se queria ter esse último recurso. Agora, esse recurso não pode ser usado como primeiro. Nós temos observado que muitos produtores, possivelmente por má orientação, estão entrando com pedidos de RJ sem ter clareza do que ela significa e dos impactos que causa. Em primeiro lugar, para si mesmos, porque ela pode levar à falência, mas também para a questão do risco sistêmico, porque, uma vez que o agente financeiro não sabe de onde vem o tiro, vem com isso o aumento de incerteza e uma restrição ainda maior creditícia, o que não é bom para ninguém. Nem para quem pede e também para quem não pede. Todos terminam sendo prejudicados pelo risco sistêmico. Então esse é um remédio que tem de ser utilizado com muita cautela. Acontece que eu estava conversando com um juiz aqui de uma vara do estado do Rio Grande do Sul para onde vai parte das RJs, e ele me disse que um percentual grande das dívidas dos produtores sequer eram passíveis de entrar dentro de uma RJ, o que suscitou uma dúvida. Se o produtor está fazendo isso, ele o faz por quê? Por que não sabe? Se não sabe, será que está recebendo a correta orientação? O fato é que a RJ é um instrumento muito pesado e de último recurso e em alguns casos, em algumas regiões, nos parece que há uma certa indústria da RJ, o que é ruim para todo o sistema, seja o financeiro ou os produtores rurais que precisam do crédito para seguir tocando para frente as suas operações. Então precisa ter prudência, cautela, saber o que está fazendo e boa orientação. Recuperações Judiciais podem, sim, ser o último recurso, mas nunca, jamais, podem ser o primeiro”. Portanto, há sim um indício de uma “indústria” gerando pedidos de recuperação judicial, porém com fortes indícios de indução a este caminho, o que com certeza prejudicará ainda mais as dificuldades de crédito desta safra.


*José Luiz Tejon é jornalista e publicitário, doutor em Educação pela Universidad de La Empresa/Uruguai e mestre em Educação Arte e História da Cultura pela Universidade Mackenzie.
O Canal Rural não se responsabiliza pelas opiniões e conceitos emitidos nos textos desta sessão, sendo os conteúdos de inteira responsabilidade de seus autores. A empresa se reserva o direito de fazer ajustes no texto para adequação às normas de publicação.