Mateus Vitoria Oliveira*
A recente decisão do presidente Lula de recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF) contra a derrubada do aumento do IOF expõe mais do que um impasse entre Poderes. Ela revela a persistência de uma lógica fiscal ultrapassada, que considera legítimo penalizar o acesso ao crédito como forma de compensar desequilíbrios nas contas públicas.
Nesse contexto, o governo justifica a medida como parte de um esforço técnico voltado à responsabilidade fiscal. No entanto, trata-se de uma política regressiva travestida de neutralidade. Na prática, encarecer o crédito penaliza justamente os segmentos mais vulneráveis da economia: trabalhadores endividados, pequenos empresários e famílias da classe média, já afetados por juros elevados e inflação persistente.
Além disso, o IOF incide sobre operações cotidianas como empréstimos pessoais, financiamentos, uso do rotativo do cartão de crédito e antecipação de recebíveis. Ao aumentar essa alíquota, o governo onera um instrumento que deveria oferecer alívio financeiro em momentos de dificuldade. Não se trata de um ajuste neutro, mas de uma escolha com efeitos sociais significativos.
Convém lembrar, ainda, que o IOF é um dos tributos mais regressivos do sistema brasileiro. Ele incide de forma uniforme, independentemente da renda, atingindo proporcionalmente mais aqueles com menor acesso a crédito em condições justas. Enquanto isso, setores econômicos mais estruturados continuam beneficiados por regimes especiais e renúncias fiscais pouco transparentes.
Diante disso, recorrer ao STF após a decisão do Congresso evidencia uma inversão de prioridades. Em vez de enfrentar as distorções do sistema tributário, que tributa consumo, isenta patrimônio e perpetua desigualdades, opta-se por ampliar a carga sobre a base da pirâmide. O resultado é previsível: menor capacidade de consumo, freio ao investimento de pequeno porte e entraves à retomada econômica.
O argumento de que a arrecadação extra financiará políticas sociais ignora um ponto: arrecadar mais dos que menos têm não é justiça fiscal. É má alocação de recursos com discurso social. O Brasil precisa, sim, de responsabilidade fiscal, mas isso começa pela revisão dos gastos, não pela ampliação de impostos.


Nesse sentido, a judicialização desse tipo de medida levanta questões sobre a separação dos Poderes. Quando o Executivo busca o respaldo do Judiciário para manter um aumento rejeitado pelo Legislativo, há um desequilíbrio institucional que compromete a legitimidade das decisões de política econômica.
Por fim, é necessário destacar que o verdadeiro problema fiscal do Brasil não está na arrecadação, mas na qualidade do gasto público. Um Estado que consome uma fatia considerável do PIB e entrega pouco precisa repensar suas prioridades. Aumentar tributos é o caminho mais fácil; enfrentar ineficiências, privilégios e subsídios mal alocados é a tarefa que segue sendo adiada.
Em suma, a tentativa de manter o aumento do IOF é um sintoma de um modelo esgotado, um modelo que opta por encarecer o crédito dos que mais precisam em vez de enfrentar os desequilíbrios estruturais que impedem o avanço de uma política fiscal eficiente.
Mateus Oliveira é CEO da Private Log e um dos principais nomes no segmento de obras comerciais, industriais e logísticas no Brasil