A maior licitação portuária do mundo já atraiu polêmicas antes mesmo da publicação do edital. O novo megaterminal de contêineres no Porto de Santos, conhecido como Tecon 10, movimenta os bastidores do setor com acusações de favorecimento, pressões políticas e ações judiciais. O jornal O Globo divulgou as informações nesta sexta-feira, 27.
Em jogo está um contrato bilionário: ao menos R$ 5,6 bilhões em investimentos e um arrendamento de 25 anos. O impasse ganhou forma com uma ação judicial movida pela gigante dinamarquesa Maersk, que questiona mudanças no formato do certame promovidas pela Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq).
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Embora a Justiça Federal tenha rejeitado, por ora, o pedido da empresa, determinou que a Antaq justifique os critérios adotados. Na proposta atual, a Antaq impede que operadoras já estabelecidas no Porto de Santos participem da primeira fase da disputa.
O argumento oficial é evitar a chamada verticalização, quando um mesmo grupo controla terminais e navios, e impedir concentração de mercado. O modelo favorece grupos ainda ausentes no porto paulista, como a subsidiária JBS Terminais, ligada aos irmãos Joesley e Wesley Batista, e a estatal chinesa Cosco.


Ambas já demonstraram interesse informal pelo projeto, que pode ampliar em 50% a capacidade de movimentação de cargas em Santos. Além disso, o subprocurador-geral Lucas Rocha Furtado, do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (TCU), alertou para o risco de prejuízo ao patrimônio público.
Para ele, o novo modelo é genérico, restritivo e compromete a valorização do ativo. O ministro Antonio Anastasia negou o pedido de suspensão do processo, argumentando que a proposta ainda passaria pelo crivo do tribunal.
Tarcísio critica regra que limita operadoras já atuantes
Os principais prejudicados seriam Maersk, MSC, Santos Brasil, ligada à francesa CMA CGM, e DP World, com forte presença atual no porto. Essas empresas só poderiam entrar na disputa se não houvesse vencedores na primeira rodada e mediante o compromisso de desinvestir em ativos já operados na região.
O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), também entrou na disputa. Para ele, a exclusão de grupos consolidados mina a concorrência e pode prejudicar a qualidade e o custo dos serviços.
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Em ofício enviado ao governo federal, auxiliares do governador sugerem permitir a participação de grandes operadoras mediante a exigência de desinvestimento posterior, caso vençam.
O ministro de Portos e Aeroportos, Silvio Costa Filho, respondeu dizendo que se sente confortável com os critérios, pois foram elaborados pela diretoria da Antaq nomeada no governo anterior, de Jair Bolsonaro. A pasta também declarou que tomará decisões somente depois de uma avaliação do TCU.
Mesmo sem assumir publicamente o interesse no leilão, a JBS tem se movimentado nos bastidores. Representantes da empresa buscaram contato com executivos de operadoras concorrentes para discutir eventuais parcerias.


A companhia dos irmãos Batista já controla o Porto de Itajaí (SC), bem menos movimentado que o de Santos, e quer ampliar seu alcance no setor.
Em março de 2023, os irmãos acompanharam o presidente Luiz Inácio Lula da Silva em visita à China. Em outra ocasião, Wesley Batista esteve em evento oficial do governo federal sobre infraestrutura em Santa Catarina. Apesar das movimentações, a JBS nega interesse formal na disputa pelo Tecon 10.
Leilão segue sem edital, mas disputa pelo porto já movimenta o setor
Embora o governo ainda não tenha publicado o edital, as empresas interessadas já contrataram consultorias e escritórios jurídicos para se preparar para a disputa. O mercado enxerga o novo terminal como estratégico, tanto pela localização privilegiada quanto pelo impacto na logística nacional.
A Antaq afirma que as mudanças visam ampliar a concorrência e foram baseadas em critérios técnicos, além de contribuições colhidas em audiências públicas.
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Portando, a agência declarou ainda que as recomendações partiram do Ministério de Portos e Aeroportos. Este, por sua vez, se disse comprometido com a participação ampla de players nacionais e estrangeiros.
Enquanto isso, os bastidores seguem agitados por suspeitas, articulações e uma corrida por influência que, mesmo antes do início formal da licitação, já molda os rumos do maior porto da América Latina.