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Lula rebate investida americana por terras raras

No mesmo momento em que o Brasil enfrenta tarifas abusivas impostas pelos Estados Unidos e vê sua diplomacia colocada à prova, uma nova frente de atrito se abre no xadrez geopolítico: o interesse explícito de Washington pelos minerais críticos brasileiros, em especial, as terras raras.

A declaração do encarregado de negócios da Embaixada dos EUA no Brasil, Douglas Koneff, de que o governo americano quer “acesso aos minerais críticos do Brasil”, não passou despercebida. Em reunião com empresários, o diplomata foi claro ao afirmar que isso faz parte da “estratégia de segurança nacional” dos Estados Unidos, deixando subentendido que o tema é tratado como prioridade militar e econômica pelo governo Trump.

A resposta do presidente Lula foi imediata e simbólica:

Ninguém põe a mão nos minerais ricos do Brasil”, disparou o presidente, durante evento em Brasília.

Uma frase curta, mas carregada de significado estratégico — e que pode ser lida tanto como um aviso quanto como uma defesa preventiva.

Essa troca pública revela muito mais do que um desacordo pontual. Ela expõe uma disputa silenciosa (e crescente) por controle de cadeias estratégicas globais, em um mundo cada vez mais fragmentado por interesses nacionalistas.

O episódio pode ser interpretado à luz da chamada “teoria do louco” (madman theory) — um conceito de política externa usado por Richard Nixon e, mais recentemente, por Donald Trump. A lógica é simples: demonstrar imprevisibilidade e disposição para medidas extremas, mesmo irracionais, para fazer os adversários cederem por medo.

No caso atual, os EUA vêm acumulando movimentos que sugerem a aplicação dessa estratégia:

  • Tarifas de 50% sobre o agro brasileiro;
  • Ameaças de sanções comerciais como resposta à política interna brasileira;
  • Declarações públicas de pressão por acesso a recursos estratégicos, como as terras raras, fundamentais para a indústria de defesa, carros elétricos e tecnologias digitais.

Sob essa ótica, o recado do diplomata americano pode não ser um deslize, mas uma jogada calculada: pressionar o Brasil em múltiplas frentes — comercial, diplomática e agora mineral — para criar tensão e obter vantagens geopolíticas sem um confronto direto.

As chamadas terras raras são elementos químicos essenciais para a produção de semicondutores, baterias, turbinas e armamentos. Embora a China detenha mais de 60% da produção global, o Brasil é uma potência latente nesse setor, com reservas significativas e, sobretudo, estabilidade institucional e acesso logístico.

Essa combinação desperta o apetite americano, principalmente num momento em que Washington busca reduzir sua dependência da China. Mas querer não é poder: o Brasil ainda não tem uma política clara de exploração e industrialização dessas riquezas, o que torna o país vulnerável a pressões externas e barganhas desiguais.

A reação de Lula tem peso político, mas o Brasil precisará de mais do que declarações firmes. Será necessário construir:

  • Uma estratégia nacional para minerais críticos, com regulação clara e parcerias equilibradas;
  • Um ambiente de investimentos que preserve o controle nacional, mas atraia tecnologia e capital;
  • E, sobretudo, coerência diplomática para não cair em armadilhas geopolíticas disfarçadas de “ajuda” ou “cooperação estratégica”.

Brasil no jogo dos gigantes das terras raras

A pressão americana por minerais estratégicos não é um caso isolado, mas parte de um redesenho global das cadeias produtivas. O Brasil está na mira. E diante de um governo americano que age segundo a lógica da “teoria do louco”, o país não pode se dar ao luxo de ingenuidade.

É preciso firmeza, mas também inteligência estratégica. Defender os interesses nacionais, sem cair em provocações, nem se curvar à chantagem, é o verdadeiro desafio.

Como disse Lula, “ninguém põe a mão”. Mas para garantir isso, é hora de transformar essa frase em política de Estado.

Miguel DaoudMiguel Daoud

*Miguel Daoud é comentarista de Economia e Política do Canal Rural


Canal Rural não se responsabiliza pelas opiniões e conceitos emitidos nos textos desta sessão, sendo os conteúdos de inteira responsabilidade de seus autores. A empresa se reserva o direito de fazer ajustes no texto para adequação às normas de publicação.

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