Após as sanções impostas à Rússia pelos Estados Unidos, União Europeia e G7, centenas de navios petroleiros passaram a operar de forma irregular. Esses navios velhos, com donos ocultos, mudam de bandeira frequentemente, desligam rastreadores e navegam sem seguro. Essa rede clandestina ficou conhecida como “frota fantasma”.
Segundo investigação da BBC News Brasil, 36 navios da frota fantasma já trouxeram combustível russo para o Brasil desde 2022, representando 17% do diesel importado no período. Como o país não aderiu às sanções internacionais, acabou se tornando um porto seguro para essas embarcações.
O salto das importações
O comércio cresceu de forma explosiva:
- 2022: cerca de US$ 100 milhões em diesel russo;
- 2023: US$ 4,5 bilhões;
- 2024: US$ 5,4 bilhões;
- Jan–jul/2025: US$ 3,07 bilhões.
Hoje, a Rússia já é o principal fornecedor de diesel ao Brasil, respondendo por mais da metade do consumo importado.
Para o agronegócio, o tema é vital. O diesel é a base do custo logístico da produção brasileira, ou seja, abastece tratores, colheitadeiras, caminhões e secadores de grãos.
O diesel mais barato ajudou a aliviar os custos no campo em anos de juros altos e margens apertadas. Porém, a dependência crescente da Rússia deixa o agro vulnerável: uma mudança brusca na política internacional, ou eventual bloqueio de navios sancionados, poderia disparar os preços e gerar insegurança no abastecimento.
Além disso, se Estados Unidos ou Europa aplicarem sanções secundárias, setores de exportação como soja, carne e café podem ser atingidos, prejudicando diretamente os produtores brasileiros.
Riscos e dilemas
Destaco três principais riscos ao Brasil com a frota fantasma de Vladmir Putin em águas brasileiras:
Ambientais: navios antigos e sem seguro aumentam o risco de acidentes e vazamentos, com potencial de afetar ecossistemas costeiros e até rotas de exportação agrícola.
Diplomáticos: empresas brasileiras envolvidas podem sofrer retaliações em mercados-chave para o agro.
Jurídicos: sem adesão às sanções, autoridades brasileiras alegam não ter base legal para impedir essas operações.
O Brasil enfrenta um dilema: manter o diesel barato que sustenta o agro e a economia, ou assumir os riscos ambientais, diplomáticos e comerciais de se tornar destino da frota fantasma.
Mais do que um debate sobre energia, trata-se de uma questão que atinge o coração da competitividade do agronegócio brasileiro.

*Miguel Daoud é comentarista de Economia e Política do Canal Rural
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