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Nova hidrelétrica chinesa reposiciona o Brasil no comércio global 

A China iniciou a construção de uma das maiores hidrelétricas da história moderna, no alto do Himalaia, na região do Tibete. A obra, avaliada em cerca de US$ 167 bilhões, terá capacidade para gerar aproximadamente 300 bilhões de kWh por ano — o triplo da famosa hidrelétrica das Três Gargantas, até então a maior do mundo e 4 vezes a geração média de Itaipu.

Essa mega infraestrutura faz parte de um plano estratégico do governo chinês para reverter a desaceleração econômica que vem afetando o país. O objetivo é claro: ampliar a oferta de energia limpa, gerar empregos, estimular setores industriais e, principalmente, expandir o consumo de milhões de cidadãos que hoje têm acesso limitado à eletricidade.

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Mais energia significa mais produção e consumo. E mais consumo na China significa mais demanda por produtos que o Brasil tem em abundância: soja, milho, carnes, minério de ferro, celulose e petróleo. Ou seja, o Brasil pode se beneficiar diretamente desse novo ciclo de crescimento.

A China já é o maior parceiro comercial brasileiro. Em 2024, mais de 40% da soja exportada pelo Brasil teve como destino o mercado chinês. O mesmo vale para outras commodities essenciais.

Esse novo movimento chinês reforça o vínculo comercial entre os dois países, abrindo espaço para o Brasil se consolidar como fornecedor estratégico da nova classe média chinesa.

Mas e a dependência? É um risco?

Sim, mas com ressalvas. A crescente interdependência entre Brasil e China é real. No entanto, os riscos dessa dependência são menores do que parecem.

O comércio bilateral está cada vez mais baseado em uma lógica de “irmãos siameses”:Vide EUA X China, hoje ambos os países precisam um do outro para sobreviver e crescer. A China precisará do Brasil como fonte estável de alimentos e energia. O Brasil, por sua vez, depende da China como maior comprador das suas exportações.

Separá-los, hoje, seria tão arriscado quanto tentar separar dois corpos que compartilham os mesmos órgãos vitais. A sobrevivência econômica de ambos está, em muitos aspectos, conectada — o que, paradoxalmente, reduz os riscos e amplia a previsibilidade da relação.

Claro, o ideal seria diversificar mercados e reduzir vulnerabilidades geopolíticas. Mas, no cenário atual, a interdependência estratégica com a China é mais uma oportunidade do que uma ameaça, desde que o Brasil mantenha inteligência comercial e política ativa.

Além dos efeitos econômicos, a construção da barragem é também uma jogada geopolítica. Localizada na bacia do rio Yarlung Tsangpo (parte superior do Brahmaputra), a obra causa desconforto na Índia e em Bangladesh, que temem o controle chinês sobre os recursos hídricos da região.

Internacionalmente, a China envia um recado claro aos Estados Unidos: está disposta a seguir investindo, crescendo e projetando poder a partir de energia limpa e infraestrutura. E isso ameaça diretamente a hegemonia do dólar, especialmente se mais países passarem a negociar com a China em yuans ou moedas locais, tendência já em curso no BRICS, o que desagrada os EUA.

O Brasil precisa ter visão estratégica. Não se trata apenas de vender mais para a China. Trata-se de:

  • Qualificar sua pauta exportadora;
  • Atrair investimentos logísticos e industriais ligados à Ásia;
  • Defender seus interesses no BRICS e fóruns internacionais;
  • Posicionar-se como liderança confiável no Sul Global.

O novo ciclo de expansão chinesa não será eterno — mas o Brasil pode e deve aproveitá-lo enquanto dura, transformando exportações em desenvolvimento interno.

Conclusão

A mega barragem no Tibete é mais do que uma obra. É o símbolo de uma China que reage à crise com ação, enquanto o Ocidente debate e hesita. Para o Brasil, é um aviso: ou aproveitamos a onda da reconstrução chinesa, ou ficaremos à deriva num mundo cada vez mais competitivo e fragmentado.

A interdependência com a China não é fraqueza, é uma realidade. E pode ser uma força, desde que saibamos conduzi-la com diplomacia, inteligência e propósito.

Miguel DaoudMiguel Daoud

*Miguel Daoud é comentarista de Economia e Política do Canal Rural


Canal Rural não se responsabiliza pelas opiniões e conceitos emitidos nos textos desta sessão, sendo os conteúdos de inteira responsabilidade de seus autores. A empresa se reserva o direito de fazer ajustes no texto para adequação às normas de publicação.

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