
O Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) começou a testar um novo modelo de seguro rural que leva em conta as práticas de manejo adotadas pelo produtor. A iniciativa, inédita no país, está em fase piloto e começou pela cultura da soja no Paraná. Ao todo, 29 áreas, somando cerca de 2,4 mil hectares, aderiram ao programa e já contrataram apólices com diferentes percentuais de subvenção, que variam conforme o cuidado com o solo.
A ferramenta faz parte do Zoneamento Agrícola de Risco Climático em Níveis de Manejo (ZarcNM) e utiliza metodologia desenvolvida pela Embrapa. O sistema classifica cada talhão em quatro níveis, considerando indicadores claros e auditáveis. Quanto melhor o manejo, maior a subvenção paga pelo governo no seguro rural.
Como funciona o novo modelo
As áreas participantes foram distribuídas nos quatro níveis previstos pelo ZarcNM:
- 5% atingiram o Nível 4, o mais alto, que dá direito à subvenção de 35%.
- 27% ficaram no Nível 3, com 30% de subvenção.
- 57% se enquadraram no Nível 2, recebendo 25%.
- 11% permaneceram no Nível 1, com o índice padrão de 20% do Programa de Subvenção ao Prêmio do Seguro Rural (PSR).
Segundo o diretor de Gestão de Riscos do Mapa, Diego Almeida, a tendência é que esse modelo se torne permanente. A expansão deve começar por outros estados produtores de soja e, depois, avançar para o milho. Para ele, a mudança ajuda a corrigir um problema histórico do seguro rural: a dificuldade de avaliar o risco climático de forma individualizada, por talhão.
Por que o manejo pesa tanto no risco climático
De acordo com o pesquisador José Renato Bouças Farias, da Embrapa Soja, propriedades com manejo mais eficiente são menos vulneráveis à seca. Práticas conservacionistas, como manter o solo protegido e aumentar sua capacidade de infiltração, reduzem o risco de perdas e garantem maior disponibilidade de água para as plantas.
“As melhorias no manejo do solo aumentam a produtividade, diminuem o impacto da seca e ainda favorecem a conservação ambiental”, afirma Farias.
Ele lembra que a maior parte das áreas de soja no Brasil não é irrigada e depende diretamente da chuva e da umidade armazenada no solo. Por isso, investir em técnicas que ampliem essa reserva hídrica se torna essencial diante das mudanças climáticas.
Tecnologia para avaliar cada talhão
Para classificar os níveis de manejo, o projeto usa seis indicadores, entre eles:
- tempo sem revolvimento do solo;
- cobertura de palhada antes do plantio;
- diversificação de culturas;
- análises químicas do solo, como cálcio, saturação por bases e alumínio.
A avaliação é feita por meio do Sistema de Informações de Níveis de Manejo (SINM), plataforma digital da Embrapa Agricultura Digital, que cruza análises laboratoriais com imagens de sensoriamento remoto. Isso permite identificar, por exemplo, áreas bem manejadas ao lado de talhões com sinais de erosão, que automaticamente recebem notas menores.
“O sistema consegue diferenciar claramente propriedades vizinhas com condições bem distintas”, explica o pesquisador Eduardo Monteiro, coordenador da Rede Zarc de Pesquisa.
Produtores veem o programa como reconhecimento
Para cooperativas que atuam no Paraná, como a Coocamar, o ZarcNM atende a uma demanda antiga do setor: reconhecer financeiramente quem investe no solo.
O gerente executivo técnico da cooperativa, Renato Watanabe, afirma que produtores com manejo adequado, mesmo em solos arenosos, tendem a resistir melhor à seca. Já áreas com rotação limitada, como apenas soja e milho, ficam mais vulneráveis.
O cooperado José Henrique Orsini, de Floresta (PR), aprovou a iniciativa. Ele costuma usar braquiária após a colheita da soja para formar palhada e melhorar o solo. Neste ano, ficou no Nível 2, com 25% de subvenção, mas afirma que uma pequena mudança no sistema — como integrar culturas no inverno — já o levaria ao Nível 3.
Outro produtor, José Rogério Volpato, alcançou o Nível 3 graças ao uso de integração lavoura-pecuária e do consórcio milho–braquiária. Ele cultiva solos arenosos e afirma que as práticas ajudam a manter estabilidade produtiva, mesmo em anos de veranico.
Nos talhões onde há braquiária, a raiz profunda rompe camadas compactadas, melhora a infiltração da água da chuva, reduz a erosão, aumenta matéria orgânica e cria um microclima mais favorável ao desenvolvimento da soja.
Próximos passos
O projeto-piloto foi regulamentado pela Instrução Normativa nº 2/2025, publicada em julho. Para a fase inicial, o governo destinou R$ 8 milhões ao programa.
A expectativa do Ministério da Agricultura é que, após os ajustes finais, o novo modelo seja adotado em escala nacional, premiando quem transforma práticas sustentáveis em resiliência e produtividade no campo.

