No domingo (27), os EUA e União Europeia anunciaram um acordo comercial histórico, que evita o aumento de tarifas e amplia a cooperação entre os dois maiores blocos econômicos do mundo. O anúncio foi celebrado por ambos como uma vitória estratégica, mas do outro lado do Atlântico, o setor agroexportador brasileiro acendeu o sinal de alerta.
Mesmo sem ser parte direta do tratado, o Brasil, maior potência agrícola do hemisfério sul, pode ser fortemente impactado. Neste artigo, explico, de forma didática e clara, como o agronegócio brasileiro corre o risco de perder espaço, competitividade e mercado com esse novo alinhamento internacional.
Desvio de comércio: Brasil pode perder mercado para os EUA
Com a redução de barreiras entre EUA e Europa, produtos agrícolas americanos poderão entrar no mercado europeu com menores tarifas ou menos exigências burocráticas. Isso favorece exportações de milho, soja, carnes e outros produtos dos EUA — justamente os principais itens da pauta brasileira.
- – Se o milho americano chegar mais barato à Europa, o grão brasileiro pode ser descartado por questões logísticas ou regulatórias.
- -O mesmo vale para carnes bovinas e suínas, onde a concorrência por cotas e mercados é cada vez mais acirrada.
Regras ambientais e sanitárias mais rígidas podem virar barreira ao Brasil
Um dos pilares do acordo é o alinhamento regulatório, especialmente em questões ambientais e sanitárias. Isso significa que EUA e UE podem adotar padrões conjuntos de produção sustentável, rastreabilidade e controle de emissões.
Para o Brasil, isso representa um risco: produtores que não conseguirem comprovar boas práticas ambientais e rastreabilidade detalhada podem ser excluídos desses mercados.
- – A União Europeia já exige “desmatamento zero” em seus fornecedores.
- -Caso os EUA adotem padrão semelhante, os dois maiores mercados do mundo passarão a exigir certificações que muitos produtores brasileiros ainda não possuem.
Impacto nos preços internacionais das commodities
Com dois gigantes exportadores cooperando, a oferta global de alimentos e matérias-primas tende a aumentar. E o resultado direto disso é a queda dos preços internacionais das commodities agrícolas.
- – Soja, milho, carne, trigo e outros produtos podem sofrer desvalorização nos mercados internacionais.
- – Isso afeta a receita direta dos produtores brasileiros, que já enfrentam margens apertadas devido a juros altos, endividamento e aumento de custos operacionais.
O risco de isolamento comercial do Brasil
Enquanto EUA e Europa avançam em parcerias estratégicas, o Brasil ainda luta para ratificar o acordo Mercosul–UE, paralisado por questões ambientais e disputas políticas.
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Se o Brasil não avançar em seus próprios acordos bilaterais ou regionais, corre o risco de ficar à margem das grandes cadeias globais de valor, perdendo acesso a mercados premium.
Além disso, a dependência crescente da China, que já responde por mais de 30% das exportações do agro brasileiro, aumenta a vulnerabilidade geopolítica do país.
O que o Brasil pode (e precisa) fazer
Para enfrentar esse novo cenário, o agronegócio brasileiro e o governo federal precisam agir em três frentes:
- Aprovar o Acordo Mercosul–UE e buscar novos pactos bilaterais com países estratégicos.
- Avançar em rastreabilidade, certificações ambientais e sustentabilidade da produção.
- Investir em agregação de valor, com produtos processados, marcas fortes e diversificação da pauta exportadora.
O novo acordo entre EUA e União Europeia não menciona o Brasil, mas terá efeitos concretos sobre o país. A competição será mais dura, as exigências serão maiores, e o espaço para improvisos será cada vez menor.
Se quiser manter sua posição de liderança mundial na exportação de alimentos, o Brasil precisará se adaptar rapidamente. O mundo está mudando, e o agro brasileiro não pode ficar parado

*Miguel Daoud é comentarista de Economia e Política do Canal Rural
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