A Organização Mundial da Saúde (OMS) divulgou na última sexta-feira, 27, o relatório do Grupo Consultivo Científico para as Origens de Patógenos Novos (Sago). No documento, o órgão reafirma que, apesar de cinco anos de investigações, não há consenso definitivo sobre a origem do SARS-CoV-2, vírus causador da covid-19.
O documento, resultado de análises de estudos científicos, dados de governos e informações de missões conduzidas desde 2020, destaca que as hipóteses mais debatidas seguem a transmissão natural de animais para humanos e um possível acidente laboratorial.
O relatório reconhece que a maioria das evidências científicas disponíveis atualmente tende para a hipótese de transmissão zoonótica — isto é, o salto do vírus de animais, possivelmente morcegos ou hospedeiros intermediários, para seres humanos. Ainda assim, os especialistas enfatizam que não é possível determinar exatamente quando, onde e como o contágio inicial ocorreu.
Segundo o grupo, “o peso das evidências disponíveis sugere uma transmissão zoonótica do SARS-CoV-2 para a população humana, seja diretamente de morcegos ou por um hospedeiro intermediário”. No entanto, os dados também mostram lacunas consideráveis que impedem uma conclusão definitiva.
+ Leia mais notícias de Saúde em Oeste
Um dos pontos centrais do debate é o papel do Mercado Atacadista de Frutos do Mar de Huanan, em Wuhan. De acordo com as análises, esse local foi importante para a disseminação precoce do vírus. Dados ambientais coletados mostraram a presença de material genético de espécies suscetíveis, como cães-guaxinim e civetas, em amostras positivas para SARS-CoV-2.
Apesar disso, o relatório destaca que “não é conclusivo que o mercado tenha sido o local do primeiro salto do vírus para humanos ou apenas um ponto de amplificação após contaminação prévia”.
O documento também relata dificuldades para acessar informações essenciais. A OMS solicitou, sem sucesso, dados detalhados sobre os animais comercializados no mercado, investigações sobre fazendas fornecedoras e registros laboratoriais.
“Sem informações que permitam avaliar completamente as condições de trabalho com coronavírus em laboratórios de Wuhan, não é possível descartar nem comprovar se uma infecção resultou de acidente de pesquisa ou falha de biossegurança”, afirmam os autores.
Leia mais:
Covid-19 e a hipótese de manipulação intencional
Em relação à hipótese de manipulação deliberada do vírus, o Sago afirma que revisou a estrutura genômica e diversos estudos e não encontrou indícios que sustentem essa teoria. O texto ressalta que “essas mutações e eventos de recombinação também ocorrem naturalmente em coronavírus”, de modo que a origem proposital permanece sem apoio de evidências científicas.
Outra área de investigação foram os relatos de circulação prévia do vírus fora da China. Estudos sobre amostras de águas residuais e exames sorológicos em países como Itália e França mostraram possível presença do vírus antes de dezembro de 2019.
Entretanto, essas descobertas não foram confirmadas por análises independentes, e os especialistas consideram os indícios insuficientes para comprovar transmissão anterior à identificação oficial dos primeiros casos em Wuhan.


O relatório também detalha investigações sobre a contaminação de animais domésticos, de criação e selvagens em diferentes países depois da disseminação do vírus em humanos. Segundo a OMS, embora surtos em visons, cervos e outros animais tenham sido confirmados em várias regiões, não há evidências de que essas infecções tenham precedido os casos em humanos.
O Sago argumenta que diversas etapas recomendadas em relatórios anteriores permanecem pendentes, como a revisão de amostras armazenadas, a testagem sistemática de animais de fazendas fornecedoras e inspeções independentes em laboratórios que pesquisavam coronavírus antes da pandemia.
Na conclusão, o grupo reforça que as origens do SARS-CoV-2 “continuarão inconclusivas até que informações adicionais sejam disponibilizadas ou novos dados científicos surjam”. O documento faz um apelo para que todos os países, principalmente aqueles que registraram os primeiros casos, compartilhem dados detalhados e colaborem com novas investigações.
Leia também: “Os selvagens da seringa”, artigo de Guilherme Fiuza publicado na Edição 71 da Revista Oeste