Dois dias após criticar Abel Ferreira por aqui, voltarei a tratar de Abel, hoje símbolo da insanidade do que é trabalhar com futebol no Brasil – ainda que no Palmeiras a sanha resultadista possa estar um tanto acima da média nacional.
Abel é o técnico mais vencedor da história do clube e atingiu a marca com conquistas nos últimos 58 meses. Tem seus defeitos como todos nós, parece cansado e está cansativo, mas não pode ser acusado de não trabalhar e não entregar o que torcedores mais costumam pedir: empenho e dedicação.
Ainda assim, o que se ouviu de boa parte da torcida palmeirense ontem foi “HEI, ABEL, VAI TOMAR NO C***”. Não foi um questionamento técnico, uma substituição vaiada, uma escalação contestada. Abel recebeu dos seus um tratamento raramente dispensado aos adversários mais odiados – reação que chocou muita gente, inclusive rivais que há tempos torcem pela troca de técnico no Palmeiras.
No balaio da discussão sobre Abel Ferreira é preciso considerar muitos pontos, prós e contras necessários para se avaliar o trabalho atual: a escolha de perfil do elenco, o bom nível de seus jogadores, a pouca criatividade em 2025, as boas campanhas na Libertadores e Brasileiro, as falhas constantes nas bolas paradas, lesões e desfalques…
Tudo faz parte do futebol e, racionalmente, neste debate, parece haver motivos tanto para críticas como para elogios ao português. Assim como houve motivos para a torcida de um distante Manchester City contestar o trabalho do galáctico Pep Guardiola na última temporada – mas certamente não passou pela cabeça de nenhum torcedor mandá-lo tomar no cu.
É legítimo que torcedores xinguem jogadores e técnicos no estádio, e acho até melhor que desopilem por ali no que nas redes sociais. Só que, embora legítimos, os xingamentos a Abel são um coquetel de irracionalidade, ignorância e ingratidão desses que só o futebol brasileiro parece capaz de produzir.
Partiram, provavelmente, da mesma turma que passou a semana pedindo “cabeça quente” e “porrada nessa porra de gambá”. Os mesmos que hoje talvez exaltem o volante Aníbal Moreno por sua atitude, como eles mesmos dizem, “pouco Nutella”.