O jornalista norte-americano Michael Shellenberger afirmou que o Supremo Tribunal Federal (STF), por meio do ministro Alexandre de Moraes, estruturou uma “força-tarefa secreta e ilegal” para perseguir manifestantes dos atos de 8 de janeiro de 2023, muitos deles apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro. A acusação foi feita em entrevista ao Oeste Sem Filtro desta terça-feira, 5.
Segundo Shellenberger, os documentos analisados por sua equipe revelam que o STF utilizou publicações em redes sociais como base para justificar investigações e prisões. As informações, contidas na segunda fase da série de reportagens “Vaza Toga“, foram publicadas nesta segunda-feira, 4.
“Os arquivos do 8 de janeiro fornecem evidências de que o ministro Moraes processou excessivamente os manifestantes para inflar as alegações de atividade criminosa e legitimar a informação de Lula que o tumulto foi uma tentativa coordenada de golpe”, declarou.


O jornalista mencionou que foram produzidas “certidões” para classificar cidadãos com base em suas interações on-line. Essas certidões seriam utilizadas para embasar decisões judiciais. “Se as pessoas curtiam posts com críticas ao Supremo, se seguiam páginas da direita, páginas de Jair Bolsonaro, elas eram marcadas como positivas, no caso, suspeitas”, explicou.
Um dos casos mencionados por Shellenberger foi o de Vildete da Silva Guardia, aposentada de 74 anos, que foi presa mesmo depois de sua certidão ter sido corrigida. “Mesmo com essa certidão corrigida, ela permaneceu na prisão e só foi libertada 21 dias depois devido a uma hemorragia intestinal grave”, recordou.
Shellenberger comparou o caso à prática soviética de criminalizar o cidadão antes de encontrar um crime. “Mostre-me o homem e eu lhe mostrarei o crime”, afirmou, em referência ao ditador comunista Josef Stálin. “Eles [STF] estão acusando o Bolsonaro e os bolsonaristas da coisa exata do que eles estão fazendo, que é um golpe do Estado.”
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O jornalista mencionou ainda conversas internas entre integrantes da equipe de Moraes que, segundo ele, demonstram a falta de respeito com os presos. Em uma dessas mensagens, atribuída ao juiz auxiliar Airton Vieira, lia-se: “Que nas audiências de custódia possamos dar a cada um o que lhe é de direito: à prisão”.
O conteúdo foi acompanhado por reações de outros participantes do grupo. “Eles estão falando como se estivessem no bar […] sobre as vidas de pessoas”, comentou Shellenberger. Entre os envolvidos nas mensagens estão o perito criminal Eduardo Tagliaferro, o juiz auxiliar Marco Antônio Vargas e a assessora Cristina Kusahara, chefe de gabinete de Moraes.
Shellenberger destacou um trecho no qual Kusahara solicita diretamente certidões com base em postagens de redes sociais antes de decidir se uma pessoa deveria ser libertada. “Ela disse: ‘O ministro Moraes não quer soltar sem antes a gente ver nas redes se tem alguma coisa’. Isso é obviamente ilegal”, afirmou.
A equipe de jornalistas que investigou os documentos é composta por David Ágape, Eli Vieira e Alex Gutentag. Shellenberger relatou que os dados foram oferecidos a veículos da imprensa brasileira, mas que “ninguém tinha coragem de publicar”. Segundo ele, o cenário começou a mudar: “A CNN Brasil […] escreveu dois artigos sobre a Vaza Toga 2”.


Sobre a possibilidade de novas publicações, o jornalista afirmou que “não tem plano de publicar mais”, pois o material já foi disponibilizado em um relatório publicado em português e inglês pela organização Civilization Works. Ele reforçou que há “muitos detalhes” e que “muitas leis foram quebradas”.
Shellenberger também respondeu a perguntas sobre a repercussão internacional do caso e criticou a imprensa estrangeira. “A mídia internacional é, mesmo da mídia brasileira, totalmente irresponsável […] é propaganda total, desinformação total”, disse.
Ele afirmou que há paralelos entre os eventos de 6 de janeiro de 2021 nos Estados Unidos e de 8 de janeiro de 2023 no Brasil, ambos apresentados como tentativas de golpe. “É impossível não ver a situação no Brasil com a perspectiva de tudo que já aconteceu aqui”, afirmou, em referência à reeleição de Donald Trump.
A entrevista encerrou com um pedido de atenção especial ao caso do ex-assessor Filipe Martins, envolvido em um escândalo com supostos dados falsificados no sistema de imigração dos Estados Unidos. Shellenberger agradeceu o convite e reiterou o compromisso de seguir acompanhando o tema.
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