Na manhã desta terça-feira, 24, o Supremo Tribunal Federal (STF) recebe a acareação entre o tenente-coronel Mauro Cid e o general Walter Braga Netto, ex-ministro da Defesa e da Casa Civil, no âmbito da ação penal que investiga uma suposta tentativa de golpe de Estado.
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A medida é uma decisão do ministro Alexandre de Moraes, em razão de relatos conflitantes apresentados por ambos sobre episódios centrais do processo.
Além desse confronto, também participarão da acareação no STF o general Marco Antônio Freire Gomes, ex-comandante do Exército e testemunha, e Anderson Torres, ex-ministro da Justiça e réu. Os dois também deram declarações contraditórias em depoimentos anteriores a respeito de reuniões e discussões relacionadas ao suposto plano.
Relatos divergentes no STF


O principal ponto de desacordo entre Cid e Braga Netto envolve uma caixa de vinho repleta de dinheiro, supostamente entregue pelo general ao ex-ajudante de ordens para financiar ações do plano denominado Punhal Verde e Amarelo. Segundo Cid, a caixa foi entregue no Palácio da Alvorada e repassada ao major Rafael de Oliveira no mesmo dia, o que implica o uso dos recursos em atividades ilícitas.
No interrogatório de 9 de junho, Cid declarou: “E aí depois, acho que, realmente o espaço temporal não me recordo, o general Braga Netto trouxe uma quantia em dinheiro, que eu também não sei precisar quanto foi, mas com certeza não foi os R$ 100 mil, porque até pelo volume não era tanto, eu peguei assim”. “Então, que foi passado para o major de Oliveira, no próprio Alvorada”, afirmou o tenente-coronel a Moraes.
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O depoente também alegou desconhecer a origem exata do dinheiro. Sugeriu apenas que poderia ter vindo de empresários ligados ao agronegócio, mas negou ter tido conhecimento prévio do plano, antes de sua divulgação pela imprensa.
Já Braga Netto, em depoimento prestado em 10 de junho, negou ter entregado qualquer quantia a Cid, seja em caixa de vinho ou sob outra forma. O general relatou que Cid o procurou para pedir apoio financeiro à “campanha” e que ele apenas encaminhou o pedido ao tesoureiro do Partido Liberal, sem obter sucesso.
“E morreu o assunto”, afirmou Braga Netto. “Eu não tinha, como eu disse ao senhor, contato com empresários. Então, eu não pedi dinheiro para ninguém e não dei dinheiro nenhum para o Cid.”
Contradições sobre reuniões e participação de Anderson Torres


No que diz respeito à reunião ocorrida na residência de Braga Netto em 12 de novembro de 2022, Cid afirmou que esteve presente por cerca de 15 minutos. Ele relatou que, ao se despedir, foi informado de que “seriam tomadas medidas operacionais” e que, por sua ligação próxima com Bolsonaro, seria melhor não participar dessas etapas.
Durante o depoimento, Cid disse que, “basicamente, eles estavam insatisfeitos com o rumo do processo eleitoral, insatisfeitos com o rumo que até as Forças Armadas estavam tratando esses assuntos”.
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“Foi uma conversa nesse nível, inicialmente desse nível, o que poderia ser feito, o que deveria ser feito, sempre nessa toada”, afirmou o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro. “Mas não teve nada, naquele momento que eu estava presente, de radicalismo ou de planejamento, ou de apresentação formal de alguma ideia, ou de alguma ação.”
Braga Netto, por sua vez, afirmou ao STF que o encontro em sua casa foi apenas uma visita de Cid, acompanhado por dois oficiais — coronel Hélio Ferreira Lima e tenente-coronel Rafael Martins de Oliveira —, ambos atualmente presos. Segundo o general, os visitantes tocaram superficialmente em temas relacionados à intervenção e ao resultado eleitoral, mas não houve aprofundamento ou discussões detalhadas.
A ‘minuta do golpe’


Outro ponto de divergência envolve a chamada “minuta do golpe”, documento encontrado na mesa de Torres. O ex-ministro declarou que o material nunca foi discutido com Bolsonaro e que sequer leu o conteúdo, tratando-o como um rascunho sem importância, disponível na internet.
“Na verdade, ministro, não é a minuta do golpe”, disse Torres, ao STF. “Eu brinco que é a minuta do Google, porque está no Google até hoje. Esse documento foi entregue no meu gabinete, no Ministério da Justiça.”
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Contrariando essa versão, Freire Gomes relatou que a minuta foi apresentada em reuniões de alto nível, com discussões sobre Estado de defesa e prisões de autoridades para análise.
“Como nós não sabíamos da pauta e esses considerandos, aquele documento, aquele apanhado de considerandos nos foi apresentado, nós não tínhamos, eu, particularmente, não tinha condição de avaliar aquele assunto ainda”, disse Gomes. “O presidente apenas apresentou, nos informou, como eu falei anteriormente, de que ele estaria estudando o assunto juridicamente e não nos perguntou de opinião. Então, nós tomamos conhecimento que ele falou que voltaria a conversar conosco após aprofundar um pouco mais os aspectos jurídicos.”