Em editorial publicado nesta terça-feira, 1º de julho, o jornal O Estado de S. Paulo criticou duramente a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o Marco Civil da Internet e destacou o voto da ministra Cármen Lúcia. Ela disse, durante o julgamento, que “a censura é proibida constitucionalmente, mas não se pode permitir que nós estejamos numa ágora em que haja 213 milhões de pequenos tiranos soberanos. Soberano é o Brasil, soberano é o direito brasileiro.”
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Para o Estadão, o julgamento mostrou o “despreparo constrangedor” de alguns ministros e o “voluntarismo” de outros. “Mas nada encarnou tão bem esse espírito daninho que animou o STF durante o julgamento quanto o voto da ministra Cármen Lúcia”, avaliou. “Noves fora a arrogância, trata-se de uma visão absolutamente distorcida da democracia, do papel do Judiciário e, não menos importante, do serviço que o Supremo deve prestar à sociedade.”
A frase escancara o espírito autoritário do julgamento: os magistrados tratam o povo como incapaz de conviver com opiniões divergentes e assumem para si o dever de vigiá-lo e tutelá-lo.
O STF decidiu que redes sociais podem ser responsabilizadas por conteúdos de usuários mesmo sem determinação judicial. A medida, aprovada no julgamento do artigo 19 do Marco Civil da Internet, abriu caminho para uma nova forma de censura digital no país.
Para o veículo, trata-se de uma medida autoritária, distorcida e perigosa para a democracia, ao permitir a responsabilização de redes sociais sem ordem judicial e transformar a Corte em agente de censura e tutela sobre os cidadãos.
Decisão traz risco de internet virar terra de ninguém
A maioria dos ministros optou por abandonar o critério de neutralidade das plataformas, autorizando a punição baseada em avaliações subjetivas e sem mediação do Judiciário. Segundo o editorial, a internet passa a operar sob o risco permanente de silenciamento prévio — motivado por denúncias individuais e interpretações ideológicas.


O resultado é uma inversão completa do princípio democrático. Em vez de proteger os direitos individuais e punir excessos comprovados, o STF delegou ao ativismo digital o poder de censura.
Qualquer pessoa, movida por ofensa pessoal ou militância ideológica, poderá acionar as plataformas para exigir a remoção de conteúdos. Se não houver filtro jurídico, o que sobra é arbítrio.
STF ignora limites legais e assume papel de tutor da sociedade
Como resultado, essa lógica confirma o avanço de uma mentalidade intervencionista dentro da Corte. Nos últimos anos, ministros como Luís Roberto Barroso e Dias Toffoli vêm defendendo que o STF assuma o papel de “poder moderador” ou mesmo “editor do país”.
Conforme o Estadão, a fala de Cármen Lúcia se encaixa nesse projeto de reengenharia social conduzido por magistrados sem voto, mas com poder absoluto.
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O Marco Civil da Internet já previa a responsabilização das plataformas em casos específicos, especialmente depois de decisão judicial. Ao ignorar esse mecanismo legal, o STF reescreve a legislação por meio de interpretações subjetivas e amplia a insegurança jurídica do setor.
Mais do que um episódio isolado, o julgamento reflete a consolidação de uma visão paternalista sobre a sociedade brasileira, afirma o jornal. O Judiciário, portanto, assume para si o direito de dizer o que o público pode ou não dizer, em vez de fortalecer sua maturidade. O resultado tende a ser o empobrecimento do debate público e a criminalização de opiniões legítimas, conclui o Estadão.