A queda histórica do desemprego para perto de 5,5% vem sendo celebrada como sinal de pleno emprego. Mas essa leitura ignora o motor real dessa estatística, o subemprego. O país não está cheio de bons empregos, está cheio de pessoas ocupadas parcialmente, informalmente ou por necessidade, o que derruba a taxa de desemprego, mas distorce a dinâmica do mercado de trabalho.
O trabalhador subocupado não aparece como desempregado, mas também não está disponível para um emprego estável e integral. E é exatamente isso que explica a sensação generalizada de “apagão de mão de obra”: milhões de pessoas estão trabalhando um pouco, não necessariamente trabalhando bem ou de maneira fixa.
Nos centros urbanos, esse fenômeno gerou uma disputa agressiva por trabalhadores. Empresas flexibilizam jornada, abandonam 6×1, oferecem prêmios e bônus, tudo para atrair alguém que hoje pode simplesmente fazer bicos, dirigir por aplicativo ou compor renda em atividades informais.
Mas para a agroindústria, o efeito é devastador. O setor depende de disponibilidade completa, rotina fixa, presença física e treinamento, exatamente o tipo de mão de obra que mais desaparece quando o subemprego cresce. O resultado já aparece em frigoríficos operando abaixo da capacidade, usinas sem gente para turnos completos e produtores incapazes de manter equipes estáveis.
O Brasil não sofre falta de pessoas. Sofre falta de trabalhadores dispostos ou disponíveis para empregos intensivos, presenciais e de jornada cheia, pilar da agroindústria.
O pleno emprego, portanto, é mais aparência que realidade. É sustentado por ocupações precárias, que deram mobilidade ao trabalhador, mas desorganizaram setores que precisam de mão de obra estável. Se o país quiser manter a competitividade do agro, precisará atacar a raiz, qualificação, formalização, retenção no campo e maior mecanização.
Enquanto isso não acontecer, o Brasil continuará vivendo esse paradoxo: uma economia “cheia de gente trabalhando”, mas vazia de trabalhadores realmente disponíveis para sustentar os setores que mais importam.

*Miguel Daoud é comentarista de Economia e Política do Canal Rural
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