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Supersafra brasileira acende alerta para preços e logística

A divulgação mais recente da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) confirma um cenário histórico para a agricultura brasileira: a safra 2024/2025 pode atingir 345 milhões de toneladas de grãos. É o maior volume já registrado, impulsionado pela ampliação da área plantada e pela recuperação da produtividade após adversidades climáticas anteriores. Soja e milho são os protagonistas dessa expansão, com projeções de recorde para a oleaginosa e produção de milho próxima de 125 milhões de toneladas. Arroz, feijão e algodão também mostram crescimento.

O desafio da abundância

O volume inédito expõe um problema estrutural: a capacidade de armazenagem no país, estimada em pouco mais de 227 milhões de toneladas (IBGE), está muito aquém do necessário para suportar a produção projetada. Isso significa que, no pico da colheita, mais de 100 milhões de toneladas podem precisar ser escoadas imediatamente para o mercado, pressionando preços e logística.

Além disso, a armazenagem em nível de fazenda ainda é insuficiente, e regiões produtoras como Mato Grosso devem enfrentar o maior aperto. A consequência mais provável é a chamada “venda forçada”, quando o produtor é obrigado a negociar a produção rapidamente, aceitando preços mais baixos para evitar perdas.

Um fator estratégico que pode impactar diretamente a competitividade brasileira é a pressão diplomática que os Estados Unidos devem exercer sobre a China para ampliar suas compras de soja americana. . A intenção americana seria elevar fortemente a soja vendida para a China,  o que reduziria drasticamente a participação brasileira no maior mercado comprador do mundo. Essa movimentação, se concretizada, intensificará a concorrência e pode agravar a pressão sobre preços e margens no Brasil.

Nos mercados futuros, a sinalização já é de cautela: soja e milho operam em patamares próximos às mínimas reais das últimas duas décadas. No Brasil, os preços internos seguem dependentes do câmbio e dos prêmios de exportação, mas o excesso de oferta no curto prazo tende a limitar altas expressivas.

Num cenário base, a soja poderia se manter entre US$ 9,80 e US$ 10,80/bushel na CBOT, e o milho entre US$ 3,70 e US$ 4,30/bushel nos próximos meses. Mas uma combinação de supersafra no Hemisfério Norte, falta de armazenagem no Brasil, desaceleração global e disputa mais acirrada com os EUA pela China poderia empurrar os preços para baixo desses intervalos.

Para evitar prejuízos e suavizar a queda de preços, sugerimos coordenação entre produtores, dentro da legalidade, para distribuir a oferta ao longo do tempo. Entre as medidas possíveis:

  • Uso ampliado de silo-bolsa como solução temporária de estocagem.
  • Formação de pools de venda por cooperativas, com entrega escalonada.
  • Contratos de hedge (futuros e opções) para travar parte da produção a preços estratégicos.
  • Parcerias logísticas para contratação conjunta de frete e espaço portuário.
  • Integração com a indústria local, direcionando parte da produção para consumo interno.

O objetivo não é manipular preços, mas reduzir a vulnerabilidade do produtor à volatilidade e ao aperto logístico, aumentando o poder de barganha e preservando margens.

A supersafra de 2025 é um marco da força produtiva do Brasil, mas também um teste para a capacidade de organização do setor. Em um cenário de demanda global moderada, infraestrutura limitada e disputa geopolítica pelo maior mercado comprador, a estratégia coletiva pode ser a chave para transformar volume em rentabilidade.

Miguel DaoudMiguel Daoud

*Miguel Daoud é comentarista de Economia e Política do Canal Rural


Canal Rural não se responsabiliza pelas opiniões e conceitos emitidos nos textos desta sessão, sendo os conteúdos de inteira responsabilidade de seus autores. A empresa se reserva o direito de fazer ajustes no texto para adequação às normas de publicação.

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