Marisa Lobo – 25/06/2025 13h41

A notícia que tomou conta das manchetes europeias nos últimos dias é chocante e dolorosa: um homem britânico, condenado por crimes sexuais e já com mandado de prisão em aberto, encenou um “casamento” com uma menina de 9 anos na Disneyland Paris e promoveu um evento semelhante com tapete vermelho em Londres.

Em pleno território europeu, com toda a tecnologia de vigilância e leis protetivas que se espera de uma sociedade avançada, uma criança foi simbolicamente usada em um ritual com forte conotação de abuso e controle.

Esse fato nos lança uma pergunta inevitável: como, em pleno século 21, ainda permitimos brechas tão graves na proteção à infância? E mais: que tipo de sociedade estamos construindo, na qual o alerta social parece cada vez mais anestesiado diante de sinais claros de risco?

A infância não se defende sozinha
Toda criança nasce com o direito inalienável à proteção, ao cuidado e ao desenvolvimento em segurança. A infância é um território sagrado e vulnerável — e cabe aos adultos, às instituições e ao Estado garantir que esse território seja respeitado. Quando um agressor com antecedentes consegue repetir esse tipo de encenação publicamente, sem impedimentos imediatos, isso expõe uma falha sistêmica grave, que deve ser enfrentada com urgência.

Esse não é um caso isolado. É um sintoma de um problema global: a relativização do risco, o enfraquecimento dos valores familiares e a crescente permissividade com atitudes que deveriam ser imediatamente repudiadas.

A preocupação é legítima — e urgente
A sociedade, felizmente, não ficou completamente indiferente. Muitos pais, educadores, terapeutas, líderes religiosos e profissionais da infância estão manifestando profunda preocupação com o avanço de conteúdos e comportamentos que, mesmo de forma simbólica, ferem os limites éticos da proteção infantil.

A liberdade de expressão jamais pode ser usada como escudo para justificar atos que flertam com o abuso ou a erotização de menores.

Não se trata de histeria coletiva. Trata-se de uma reação saudável e legítima de uma sociedade que ainda valoriza a pureza, a dignidade e o direito da criança a crescer longe de qualquer exploração.

O papel da psicologia e da fé
Como psicóloga e como cristã, reafirmo que a criança precisa ser amparada em todas as esferas: emocional, legal, espiritual e comunitária. A neurociência já demonstrou que o trauma na infância compromete o desenvolvimento neurológico, emocional e social por toda a vida.

E a fé cristã nos alerta sobre a gravidade de fazer qualquer pequeno tropeçar:

Se alguém fizer tropeçar um destes pequeninos, melhor lhe fora que lhe pendurassem ao pescoço uma pedra de moinho e fosse lançado ao mar (Marcos 9:42)

Essa advertência não é apenas religiosa — é um apelo moral. Um chamado à responsabilidade intergeracional.

Caminhos possíveis
Esse triste episódio deve ser transformado em ponto de partida para uma mobilização séria e concreta, que envolva:

— Revisão urgente nos mecanismos de monitoramento de abusadores condenados;

— Fortalecimento das leis de proteção à infância e penas mais rigorosas para atos de simbologia abusiva;

— Educação familiar e escolar para a detecção precoce de comportamentos abusivos;

— Campanhas públicas que valorizem a dignidade da criança e denunciem a erotização precoce;

— Apoio psicológico e espiritual para famílias e vítimas.

A infância é responsabilidade de todos nós
Precisamos, como sociedade, reafirmar que a infância não é terreno neutro, nem espaço para experimentações artísticas duvidosas. É nossa missão proteger o que é puro, denunciar o que é violento — mesmo quando disfarçado — e construir redes reais de vigilância e cuidado.

Se esse episódio nos causou indignação, que ele também nos mova à ação.

Marisa Lobo atua como psicóloga e psicanalista, é pós-graduada em Psicanálise; Gestão e Mediação de Conflitos; Educação de Gênero e Sexualidade; Filosofia de Direitos Humanos e Saúde Mental; tem também habilitação para magistério superior.

* Este texto reflete a opinião do autor e não, necessariamente, a do Pleno.News.

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